Revista Profissional do Exército dos EUA

Edição Brasileira

Artigos Exclusivamente On-line de Maio de 2017

A Essência da Liderança

Confiabilidade

Sara VanderClute

Artigo publicado em: maio de 2017

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O Sergeant Major of the Army

Nunca fui oficial das Forças Armadas, mas, como muitos outros parentes de militares, conheci e fui influenciada por vários comandantes durante e depois das décadas em que meu marido serviu ao Exército. Ele passou para a reserva em 1988. Assim, é na qualidade de civis e moradores dos arredores de Fort Bragg, no Estado da Carolina do Norte, que temos observado os comandantes militares das últimas décadas. Alguns tornaram-se famosos; outros, infames. Cada um deles reforçou minha convicção de que, dentre as várias facetas da liderança — entusiasmo, imparcialidade, competência e abnegação —, sua essência é a confiabilidade, baseada na integridade.

Os comandantes do Exército em Fort Bragg estão bem integrados à comunidade civil, quer residam no forte ou não. A câmara de comércio local possui um comitê de assuntos militares, e os comandantes interagem socialmente com a comunidade civil. Eles mantêm os líderes políticos locais informados de mudanças no Departamento de Defesa que possam afetar seus municípios. Esses comandantes são vizinhos, clientes, frequentadores das mesmas igrejas e amigos dos moradores locais. São respeitados como sendo a nata das forças militares da nação e extremamente admirados por suas realizações e sacrifícios pessoais em serviço ao país. O que é mais importante: os moradores locais podem confiar neles e contar com sua honestidade e franqueza.

Não existe um único modelo para a personalidade de um líder. Na época em que meu marido serviu ao Exército, conhecemos alguns comandantes que eram mais calados e intelectuais, com um senso de humor irônico; outros eram dinâmicos, temperamentais e dotados de uma linguagem pitoresca. Alguns eram ríspidos e tradicionais, soldados “à moda antiga”. Outros estavam anos-luz à frente de seus contemporâneos, por perceberem como o futuro se desdobraria. Na época em que meu marido serviu, houve momentos de transição que abriram mais oportunidades para mulheres militares e incluíram considerações mais explícitas sobre as necessidades das famílias militares. Alguns comandantes acolheram essas mudanças de bom grado; outros acreditavam que, se o Exército quisesse que você tivesse uma família, ele a teria fornecido.

Aprendi durante o período em que fui esposa de um militar da ativa que a excelência em liderança na Força não estava necessariamente ligada ao grau hierárquico ou cargo, e essa lição foi confirmada na minha vida pós-Exército. Às vezes, o líder mais efetivo de um grupo não é o “líder” oficial. Além disso, no Exército e nas Forças Armadas em geral, há excelentes líderes no nível de pequenas frações, como grupo de combate ou pelotão. Alguns poucos chegarão ao posto de Chefe da Junta de Chefes de Estado-Maior, no qual ajudarão a liderar a nação ao assessorarem o Presidente em assuntos militares. Outros poucos servirão no alto escalão do governo, após suas carreiras militares.

Os mesmos atributos que caracterizam excelentes líderes militares se aplicam à vida civil. Muitos veteranos, sejam oficiais ou graduados, alcançaram carreiras notáveis no setor de negócios e na política, após deixarem o serviço militar. O entusiasmo, a imparcialidade, a competência e a abnegação continuam existindo nos indivíduos que levam sua capacidade de liderança para suas carreiras e comunidades civis — da mesma forma que a integridade. O meio empresarial, a política, as profissões médica e legal e as organizações sem fins lucrativos em todas as partes dos EUA têm se beneficiado da capacidade de liderança de ex-militares.

As últimas duas décadas nos lembraram, de tempos em tempos, que os comandantes militares são seres humanos. São vulneráveis às mesmas fraquezas e tentações que afligiram a humanidade ao longo de toda a História. Vemos manchetes que fazem alarde da queda humilhante de algum oficial-general respeitado. Nos últimos vinte anos, mais de um oficial militar do alto escalão confessou ou foi condenado por infrações que incluíram desde a noção vaga de “conduta imprópria para um oficial” até crimes graves, de fraude, suborno, agressão sexual, bigamia e adultério (infração imputável segundo o Código Uniforme de Justiça Militar dos EUA).

Em uma comunidade militar, até as fraquezas de um comandante pouco conhecido podem chegar às primeiras páginas de um jornal local. Ocasionalmente, as notícias locais passam a ser nacionais. Minha primeira reação é de decepção, por ver um comandante que, aparentemente, havia provado seu valor, perder seu rumo e bússola moral. Em seguida, fico pensando na família dele, que ficará exposta ao mesmo grau de análise e crítica que o próprio transgressor. No entanto, como estou longe de ser perfeita, evito julgar.

Apesar disso, entendo que os erros graves de discernimento por parte de um comandante são tão corrosivos à confiança quanto o ácido ao ferro. As pessoas não apoiarão um comandante em quem não confiem. Podem duvidar, divergir ou discordar fortemente de um líder; podem até não gostar dele; mas se confiarem que ele fará o que for correto em todas as circunstâncias — mesmo a um elevado custo para si próprio — elas o seguirão.

O Gen Colin Powell

O Gen Colin Powell relatou, em certa ocasião, uma lição que havia aprendido muito anos antes, com um sargento na Escola de Infantaria de Fort Benning: “Você sabe que é um bom líder quando as pessoas o seguem [mesmo que apenas] por curiosidade”1. Powell, que passou para a reserva do Exército em 1993, é um líder que eu admiro. Ele reconhece quando comete um erro. Demonstrou integridade ao longo de sua carreira militar e, posteriormente, no serviço público e nos segmentos com e sem fins lucrativos; por isso, as pessoas confiam nele.

A confiabilidade de um superior é algo valioso não só para os pares e subordinados, mas também para aqueles sob quem ele sirva; esse princípio se aplica aos comandantes militares em particular. Todos os subordinados, superiores ou pares de um comandante precisam confiar em sua integridade. Por exemplo, todo presidente ia gostar de saber que seus assessores militares têm a lealdade de dizer a verdade a superiores em vez de, simplesmente, expressarem o que for considerado politicamente correto. Todo comandante de batalhão ou pelotão precisa confiar na integridade de outros comandantes no mesmo escalão. É importante honrar os juramentos feitos, quer se esteja prestando um depoimento perante um tribunal ou comandando soldados em um campo de batalha.

Observei e aprendi com vários líderes militares e civis. Nos anos desde que meu marido passou para a reserva, minha carreira no segmento civil me expôs a salas de redação e de diretoria, a cargos de gerência e a funções de voluntariado comunitário. Servi no conselho de diretores de uma escola local e como presidente do conselho de administração de uma biblioteca. Digo isso não para alardear minhas credenciais de liderança, mas para contextualizar minha perspectiva. A maioria dos líderes que observei fez o correto, independentemente do custo pessoal. Isso é integridade. É isso que faz com que um líder seja confiável.

Nas últimas duas décadas, alguns comandantes militares — talvez vários — decepcionaram suas tropas, o público norte-americano e suas próprias aspirações pessoais ao cometerem transgressões que viraram manchetes de jornais. O fato de terem caído em desgraça oferece lições de advertência — bem ou mal, são considerados exemplos. Alguns observadores aprendem apenas a não serem pegos fazendo algo errado. A maioria assimila uma lição mais difícil: não fazer algo que saibam ser errado. Os que sucumbem à bajulação, cobiça, ganância ou luxúria representam anomalias lamentáveis. Quando avaliados em relação aos milhares que honraram seus vários juramentos ao servir, não há comparação.

Os comandantes militares são, em sua maioria, pessoas honradas, e podemos confiar que obedecerão aos seus juramentos, à lei e às normas de conduta ética. Podemos confiar-lhes a vida dos soldados e a defesa da liberdade. Eles procedem calmamente no cumprimento de seus deveres em uma das profissões mais exigentes e perigosas do mundo. Cuidam de seus subordinados e famílias e de sua própria integridade. Seus nomes não aparecem com frequência nas manchetes, mas é possível encontrar muitos deles nas relações nominais dos que ainda estão na ativa, foram mortos ou feridos em combate ou passaram para a reserva. Aqui na Carolina do Norte, muitos podem ser encontrados nas páginas da lista telefônica local.

Com o passar das décadas, cada era verá seus militares ascenderem a funções de liderança. Independentemente de sua personalidade ou estilo pessoal, os líderes inesquecíveis — que inspiram alguns militares ou a nação inteira — serão aqueles cuja efetividade se apoia em sua integridade. Serão os líderes que sempre fazem o que é certo para seus subordinados e famílias e para seu próprio legado.

Companhia de Polícia Militar

Referência

  1. Colin Powell, “View from the Top” lecture series (discurso, Stanford University Black Business Students Association and the Graduate School of Business, Stanford, CA, 16 Nov. 2005).

Sara VanderClute é a esposa do Tenente-Coronel Burt VanderClute, da reserva remunerada do Exército dos EUA. Durante 21 anos de serviço, os VanderClutes moraram na Alemanha, Turquia e Fort Bragg, no Estado da Carolina do Norte. Hoje vivem em Fayetteville, na Carolina do Norte.

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