Military Review

 

Isenção de responsabilidade: Em todas as suas publicações e produtos, a Military Review apresenta informações profissionais. Contudo, as opiniões neles expressas são dos autores e não refletem necessariamente as da Army University, do Departamento do Exército ou de qualquer outro órgão do governo dos EUA.


Artigos Exclusivamente On-line de maio de 2025

 

Alfabetização de dados

Como nos preparamos para o futuro

 

Gen Gary M. Brito, Exército dos EUA

Tradução de Ana Luisa Gauz, Army University Press

Baixar PDF Baixar PDF

 
Operador da Equipe Expedicionária de Atividades Cibereletromagnéticas-01

O TRADOC está desenvolvendo hoje os soldados e comandantes das futuras formações do Exército.

—TP 525-92, Ambiente operacional 2024-2034

 

O mundo mudou bastante desde que fui comandante de pelotão há várias décadas. No entanto, a necessidade de prontidão para o combate não mudou, e pode-se dizer que é ainda mais relevante atualmente. Os domínios espacial, cibernético e outros aumentaram a complexidade das nossas operações. A tecnologia está evoluindo em um ritmo cada vez maior. A ampla disponibilidade de tecnologias emergentes, mais baratas e disruptivas mudou as ameaças que enfrentamos. Nossos adversários também estão se tornando mais fortes, mais rápidos e mais letais a cada dia.1 Embora muitos dos fundamentos da guerra permaneçam inalterados ao longo da história, não é hora de agir como de costume. Essenciais à capacidade do nosso Exército de atirar, movimentar-se, comunicar-se e prestar primeiros socorros em um campo de batalha moderno são os soldados e comandantes alfabetizados em dados, que podem rapidamente tomar decisões sensatas, utilizando todos os recursos disponíveis para se aproximar do inimigo e destruí-lo em um campo de batalha cada vez mais transparente e dinâmico. Não me entenda mal — nosso Exército deve continuar sendo a força de combate letal que sempre foi: em forma, disciplinado e com domínio das habilidades de combate. No entanto, a abundância de dados é hoje uma condição para a qual devemos nos preparar.

Atualmente, muitas pessoas falam sobre a importância da alfabetização de dados, com muitas ideias diferentes sobre o que é alfabetização de dados ou como está conectada à alfabetização digital. Na verdade, a alfabetização de dados é uma das habilidades mais requisitadas no mundo moderno.2 Nossa doutrina define a alfabetização de dados como a capacidade de ler, analisar e se comunicar com dados.3 Várias instituições acadêmicas definem a alfabetização de dados de forma semelhante. Esse não é um conjunto de habilidades totalmente novo, principalmente no Exército. Sempre houve a necessidade de captar observações sobre o nosso ambiente e, em seguida, processar e analisar esses dados para gerar entendimento e conduzir ações no campo de batalha. Por que isso é importante? Na minha opinião, o acesso a grandes quantidades de dados é tão relevante no campo de batalha quanto em casa. Os dados devem ser gerenciados, filtrados e compreendidos para serem úteis. Caso contrário, serão apenas entulho. O ritmo acelerado da expansão tecnológica e a explosão de sistemas digitais que nos fornecem dados ressaltam a necessidade de soldados alfabetizados em dados.

O então Ten Gary Brito em Doughboy City, uma simulação de um vilarejo de Berlim, em 1989

Com tantos dados disponíveis, é um desafio usar nossos sistemas rapidamente para obter informações significativas que orientem as decisões. Mas à medida que nosso Exército se transforma, essa é uma oportunidade interessante para garantir que identifiquemos as habilidades que nosso pessoal — nossa principal vantagem — precisa para combater e vencer. Enquanto isso, nossos adversários também estão aprendendo a explorar rapidamente grandes quantidades de dados disponíveis em sensores que são onipresentes no campo de batalha moderno.4 Em um ambiente de quantidades excessivas de dados, é fundamental que nossos soldados e comandantes sejam alfabetizados em dados sem comprometer a proficiência individual e coletiva; devemos nos preparar para o combate futuro e, ao mesmo tempo, garantir que estejamos prontos para combater hoje.

À medida que nosso Exército passa por uma das maiores transformações em muitas décadas, estamos realizando uma versão moderna das Louisiana Maneuvers do início da década de 1940, experimentando e treinando com novos equipamentos, formações e recursos.5 Seja por meio do C2 Fix,NT da transformação no contato ou de diversos locais de treinamento que vão desde exercícios de combate a treinamento com aliados, estamos experimentando novos recursos em escala global e examinando não apenas qual equipamento novo e interessante implantar, mas também qual é a melhor forma de empregar nossa força moderna em larga escala e em diversas condições.6 Com uma abundância de recursos digitais mais recentes, estamos experimentando a melhor forma de atirar, movimentar-nos e comunicar-nos no ambiente operacional atual e futuro. Independentemente do material bélico novo em que investirmos, nada disso será possível sem soldados e comandantes capazes de aproveitar todas as ferramentas disponíveis com agilidade mental, autoconfiança e compreensão da melhor maneira de dominar, combater e vencer em qualquer campo de batalha.

NT: Iniciativa do Exército dos EUA para simplificar e modernizar as redes de comunicação das divisões e suas brigadas de combate.

Soldados alfabetizados em dados, que sabem ler, analisar e se comunicar com os dados disponíveis, podem oferecer insights aos comandantes de todos os escalões. Podem manter a agilidade e compartilhar informações úteis rapidamente. Isso nos permite criar um entendimento compartilhado entre formações e escalões superiores e inferiores para promover ações eficazes e integradas em um campo de batalha em múltiplos domínios. Aqueles que conseguirem obter efetivamente as observações mais relevantes no momento em que forem necessárias, usando sistemas eficazes para classificar rapidamente todos os dados disponíveis, poderão usar com mais eficácia toda a força dos recursos modernos em um campo de batalha complexo.

Operacionalizando a alfabetização de dados

À medida que nos transformamos para atender às demandas do ambiente operacional atual e futuro, não há solução fácil que garanta que manteremos uma vantagem esmagadora sobre nossos adversários. Precisamos das pessoas certas — bem treinadas em seus respectivos conjuntos de habilidades e confortáveis com as habilidades do mundo moderno e mais digital — que possam empregar a tecnologia e os recursos emergentes, muitas vezes integradas a outras formações, para obter efeitos letais e influentes no campo de batalha. E como não enviamos indivíduos para a guerra, mas sim formações, precisamos que nossas formações sejam concebidas e organizadas de modo que os comandantes de cada escalão estejam capacitados e posicionados para melhor sincronizarem os efeitos em um campo de batalha de múltiplos domínios.

Comandante de grupo de combate designado para a Companhia Alpha

Nossas observações sobre os conflitos atuais e a experimentação com a robótica e a integração homem-máquina demonstram que as formações de nossa força futura terão uma mistura de humanos e sistemas autônomos.7 Também sabemos que o futuro campo de batalha será altamente congestionado e disputado ao longo do espectro eletromagnético, que não é visível a olho nu, mas pode afetar a forma como as máquinas e os sistemas digitais operam.8 Quando os sistemas de comunicação são perturbados, esse ambiente torna o comando de missão e a confiança para cima e para baixo na cadeia de comando mais importantes do que nunca. Isso também mostra a necessidade de que os soldados de todos os escalões pensem criticamente sobre os dados que seus sistemas disponibilizam e entendam como ler, analisar e comunicar esses dados adequadamente.

Imagine um campo de batalha repleto de sensores, tanto humanos quanto de máquinas. Isso muda a forma como processamos alvos, respondemos aos requisitos de informação crítica do comandante e ajudamos os líderes a tomar decisões em tempo hábil e fundamentadas para garantir o sucesso da missão no campo de batalha.9 Se os comandantes e seus soldados não compreenderem como interagir com os dados disponíveis em seu ambiente ou como fazer perguntas relevantes para receberem informações acionáveis a partir dos dados, os sensores onipresentes fornecerão uma enxurrada de dados, com informações menos significativas. Os sistemas digitais não sabem intuitivamente o que um comandante está buscando, nem como agrupar os pontos de dados das observações em informações significativas. Eles fornecerão exatamente as informações que foram programados para fornecer. As máquinas precisam de um ser humano no circuito, um soldado ou comandante alfabetizado em dados para completar o quadro.

O comando de missão — a abordagem do Exército em relação ao comando e controle que capacita a tomada de decisão dos subordinados e a execução descentralizada — é fundamental para a nossa cultura.10 Em um futuro campo de batalha disputado e congestionado, essa abordagem em que a confiança e a disciplina exercida são primordiais é ainda mais crítica para o êxito no campo de batalha. Os comandantes devem entender como organizar seu pessoal e estabelecer sistemas e processos humanos aprimorados com ferramentas digitais para oferecer informações rápidas e relevantes. Os soldados devem pensar de forma crítica sobre os dados e as informações que recebem e ser intencionais em suas comunicações. O uso inadequado ou a má compreensão dos dados podem levar a uma tomada de decisão ruim ou, pior ainda, custar vidas. Isso não significa que devemos temer os sistemas digitais ou as novas tecnologias, mas também não devemos subestimá-los. Afinal de contas, nenhum de nossos recursos de materiais bélicos funciona sem que nossos soldados e comandantes os conduzam.

Institucionalizando a alfabetização de dados

Não esperamos que todo soldado ou civil de nosso Exército seja um cientista de dados. Conforme mencionado anteriormente, precisamos das pessoas certas, munidas de habilidades básicas, que possam empregar a tecnologia emergente mais recente para obter efeitos impactantes. Precisamos que nossos soldados e comandantes façam treinamento físico, se qualifiquem com as armas que lhes foram designadas, prestem primeiros socorros e leiam, analisem e comuniquem dados apropriados às suas respectivas funções e posições. Nosso Exército se dedica a desenvolver seu pessoal, e o Comando de Instrução e Doutrina (Training and Doctrine Command, TRADOC) do Exército dos Estados Unidos da América (EUA) define os padrões de treinamento do nosso Exército para essas habilidades.11

Left Quote

Precisamos que nossos soldados e comandantes façam treinamento físico, se qualifiquem com as armas que lhes foram designadas, prestem primeiros socorros e leiam, analisem e comuniquem dados apropriados às suas respectivas funções e posições.

Right Quote

A alfabetização de dados, como qualquer habilidade, é desenvolvida ao longo do tempo por meio de treinamento repetitivo e progressivo e do reforço dessas habilidades em ambientes operacionais. Atualmente, o TRADOC está focando na educação de comandantes para aumentar a alfabetização de dados básica em toda a força, ao mesmo tempo que mantém a disponibilidade de cursos para pessoas que desejem expandir suas habilidades de alfabetização de dados.12 Estamos trabalhando também para elaborar instruções de alfabetização de dados adequadas ao escalão em todo o espectro do desenvolvimento, desde a instrução militar inicial até os níveis mais altos de educação profissional militar. Por meio da parceria com a força operacional, as habilidades de alfabetização de dados dos soldados continuam a se desenvolver ao longo de suas carreiras, à medida que são aplicadas em situações do mundo real e em cenários de adestramento coletivo com suas unidades. O soldado em treinamento básico de combate hoje participará do Curso Básico de Liderança em alguns anos. O tenente que hoje participa do Curso Básico de Liderança para Oficiais participará do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais daqui a quatro ou cinco anos. O ponto é que um espectro de aprendizado entre o treinamento institucional em ambientes físicos e o treinamento na sede (unidade de designação) é fundamental para manter a alfabetização de dados em primeiro plano.

Nos escalões acima de brigada, o Exército também está aprendendo, mediante a experimentação e o treinamento de unidades, que talvez precisemos de alguns que sejam integradores e analistas de dados para possibilitar a tomada de decisão. A solução pode não ser uma abordagem única, mas estamos trabalhando para oferecer uma estrutura organizacional de linha de base que as unidades possam adaptar de acordo com seu ambiente. Trata-se de um esforço de equipe entre o TRADOC, o Comando de Futuros do Exército (Army Futures Command) e as unidades operacionais.

A tecnologia está evoluindo em um ritmo cada vez maior — o mundo talvez nunca tenha visto a interseção de tantas tecnologias novas — e nossos adversários estão ficando mais fortes e mais ousados. Isso exige comandantes mentalmente ágeis que possam se adaptar rapidamente a um ambiente operacional em rápida transformação. Uma força alfabetizada em dados estará mais bem preparada para melhor compreender e operar no ambiente operacional atual e futuro e aproveitar todos os recursos dos itens de seu kit de ferramentas. Em termos mais simples, como exército, devemos ser capazes de atirar, movimentar-nos, comunicar-nos e nos manter com todas as ferramentas e recursos disponíveis, independentemente da evolução de nosso ambiente operacional.


Referências

 

  1. TP 525-92, Operational Environment 2024–2034.
  2. Jordan Morrow, Be Data Literate: The Data Literacy Skills Everyone Needs to Succeed (Kogan Page, 2024), p. 17-18.
  3. Army Doctrine Publication 3-13, Information (U.S. Government Publishing Office [GPO], November 2023), p. 3-15.
  4. TP 525-92, Operational Environment 2024–2034, p. 14-15.
  5. Dwight Jon Zimmerman, “The Last and Largest Wargame Before World War II: The Louisiana Maneuvers”, Defense Media Network, 15 August 2011, https://www.defensemedianetwork.com/stories/the-last-and-largest-wargame-before-world-war-ii-the-louisiana-maneuvers/.
  6. Carley Welch, “What Army Officers Hope C2 Fix Will Actually Fix in the Field”, Breaking Defense, 11 December 2024, https://breakingdefense.com/2024/12/what-army-officers-hope-c2-fix-will-actually-fix-in-the-field/; Milford H. Beagle Jr. e Tyler J. Rund, “Continuous Transformation: Institutional Transformation in Contact”, Military Review Online Exclusive, 22 November 2024, https://www.armyupress.army.mil/Journals/Military-Review/Online-Exclusive/2024-OLE/Institutional-Transformation/.
  7. James Rainey e Laura Potter, “Delivering the Army of 2030”, War on the Rocks, 6 August 2023, https://warontherocks.com/2023/08/delivering-the-army-of-2030/; Josh Luckenbaugh, “AUSA News: Army Gaining Ground on Human-Machine Integrated Formations”, National Defense, 14 October 2024, https://www.nationaldefensemagazine.org/articles/2024/10/14/army-gaining-ground-on-human-machine-integrated-formations.
  8. TP 525-92, Operational Environment 2024–2034, p. 3.
  9. Field Manual (FM) 3-98, Reconnaissance and Security Operations (U.S. GPO, January 2023), p.1-18.
  10. FM 6-0, Commander and Staff Organization and Operations (U.S. GPO, May 2022), p. 1-3.
  11. Army Regulation 350-1, Army Training and Leader Development (U.S. GPO, December 2017), parágrafo 2-23.
  12. “KM Training and Professional Development Portal”, TRADOC, acesso em 19 dez. 2024, https://www.tradoc.army.mil/ocko/training-portal/data-literacy/.

 

O Gen Gary M. Brito, do Exército dos EUA, é comandante do TRADOC na Base Conjunta Langley-Eustis, Virgínia. Anteriormente, serviu como Subchefe do Estado-Maior, G-1, do Exército dos EUA em Washington, D.C.; e como comandante do Maneuver Center of Excellence do Exército dos EUA em Fort Benning, Geórgia. Tem mestrado em Gestão de Recursos Humanos pela Troy State University e em Estratégia Conjunta e Planejamento de Campanha pela Joint Advanced Warfighting School. Cumpriu missões no Iraque e no Afeganistão.

 

 

Voltar ao início