Military Review

 

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O Perigo das Ilusões — e Como Evitar que Essas Causem Conflitos

Uma Perspectiva sobre a China

Cel Michael J. Forsyth, Exército dos EUA

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O Secretário de Defesa Ash Carter (à esquerda) e o Secretário de Defesa Nacional filipina Voltaire Gazmin apertam mãos em um V-22 Osprey, do Corpo de Fuzileiros Navais, ao partir do USS John C. Stennis, depois de visitar o navio aeródromo no Mar da China Meridional, 15 Abr 16. Carter visitou as Filipinas como parte de um esforço para solidificar o reequilíbrio na região Ásia-Pacífico. (Suboficial Adrian Cadiz, Força Aérea dos EUA)

Em 2015, eu tive a oportunidade de receber um oficial superior chinês durante a sua visita aos Estados Unidos. Durante a sua permanência, ele exprimiu continuamente que os Estados Unidos devem respeitar a China, e que não devem seguir uma política de contenção. Independente do assunto em discussão, o oficial sempre voltou a esse tema. Parecia para mim que essa percepção de perseguição chegava quase a ser uma paranoia.

Ao supor que as declarações do oficial chinês representavam as opiniões das autoridades do seu país, eu me lembrei da situação histórica da Alemanha Imperial antes da Primeira Guerra Mundial. O medo irracional de ser cercado influenciou a classe política e militar da Alemanha, uma mentalidade que contribuiu para o advento da guerra. Eu me perguntei se os chefes militares chineses, como as autoridades alemãs do passado, estariam começando a acreditar que outros países na sua região estavam tentado cercá-los. Se for assim, o precedente histórico sugere que essa paranoia por parte da China pode ter consequências graves, particularmente se a China reagir com exagero às presumidas ameaças contra a sua soberania.

Para evitar mal entendidos e as subsequentes consequências que possam ocorrer, os Estados Unidos e os seus parceiros na região Ásia-Pacífico precisam esforçar-se para desfazer essa noção — onde ela existir entre as autoridades chinesas — de que os Estados Unidos e os seus parceiros estão tentando conter a China. Os Estados Unidos podem realizar isso com uma estratégia de equilíbrio cuidadosamente implementada.

A Alemanha antes de 1914

Em 1871, uma Alemanha unificada surgiu no palco mundial como uma grande potência depois da impressionante derrota da França, na Guerra Franco-Prussiana1. Antes de 1871, os povos germânicos estavam divididos entre dezenas de pequenos reinos, ducados, principados e cidades livres, bem como em dois grandes Estados, a Áustria e a Prússia — que se competiam pela liderança desse conglomerado de entidades políticas. Nessa disputa, a Prússia tinha gradualmente ascendido em poder ao longo dos séculos XVIII e XIX, obtendo grande influência entre esses dispersos e, em sua maioria, pobres Estados germânicos, ao mesmo tempo que a influência da Áustria tinha lentamente declinado. Não obstante, esses dois Estados mais poderosos competiam para unir os reinos mais fracos de etnia alemã sob uma única bandeira de liderança germanófona2.

A disputa atingiu o seu ápice em 1866 quando a Áustria e a Prússia travaram uma breve guerra pela hegemonia sobre os Estados alemães menores. A Prússia surpreendeu a Áustria com uma vitória rápida e decisiva em Königgrätz, em 3 de julho de 1866. Desde então, o Império Austríaco assumiu uma posição subordinada à Prússia3. Depois, a Prússia estabeleceu uma confederação livre de Estados germânicos, não concluindo uma unificação política completa. Contudo, suficiente controle sobre a política externa e os assuntos militares foi concedido à Prússia que permitia que essa pudesse ditar as atividades dos seus vizinhos4.

Em 1870, o atrito prolongado entre os franceses e os prussianos levou à guerra. O Chanceler prussiano Otto von Bismark armou uma crise que exigia que a Prússia agisse para salvar a sua honra. Com um arranjo de forças da confederação e o seu próprio grande exército, a Prússia mobilizou um exército combinado que sobrepujou a França. No final das hostilidades em 1871, Bismark aproveitou a oportunidade para proclamar a criação de um Império Alemão unido sob a liderança do rei prussiano, agora imperador, Guilherme I. Durante uma cerimônia, em 1871, na Sala dos Espelhos em Versalhes, em Paris, o novo Estado afirmou o seu domínio. A partir disso, a nova balança do poder entre as grandes potências da Europa pendeu pesadamente para a Alemanha imperial5. Em apenas uns poucos anos, a nova nação forjada da miscelânea de reinados e ducados fracos e desunidos tinha se tornado o poder mais forte no continente europeu. Como tal, a Alemanha inspirou respeito, e fomentou temor, entre os seus vizinhos.

A França, a Grã-Bretanha e a Rússia, percebendo uma ameaça mútua representada pelo Império Alemão, formaram o que chegou a ser conhecida como a Tríplice Entente, em 1907, para enfrentar a rápida ascensão da Alemanha. Elas consideravam a sua aliança como uma espécie de “seguro” contra expansão alemã futura, por meio de compromissos de apoiar uma à outra com forças militares em caso de um conflito.

Os chefes alemães, por outro lado, naturalmente viam essa aliança como uma tentativa de impedir a ascensão do seu país. Como resultado, as autoridades alemães — especialmente o Kaiser Guilherme II, que sucedeu Guilherme I, em 1888 — começaram a acreditar que seus vizinhos estavam tentando cercar a nação. No caso de Guilherme, alguns historiadores acreditam que o seu estado mental beirava a paranoia. Durante seus encontros com outras autoridades europeias, Guilherme e os seus ministros declaravam rotineiramente que a Alemanha precisava de um “lugar ao sol” e espaço adequado para viver6. Os seus processos mentais são considerados a principal razão do advento da Primeira Guerra Mundial, em que a Alemanha atacou primeiro para evitar um envolvimento.

Preocupado que as grandes potências da Europa estavam conspirando para cercear a Alemanha e limitar o seu poder e influência no continente, o Kaiser Guilherme II, imperador da Alemanha e rei da Prússia, se reuniu, em 8 de dezembro de 1912, com os seus principais conselheiros militares para discutir as linhas de ação, incluindo a possibilidade de declarar a guerra. A reunião chegou a ser conhecida como o “Conselho da Guerra”. (Foto cortesia da Wikipedia)

A China desde a Segunda Guerra Mundial

A encarnação moderna da China como uma nação é, em algumas formas, paralela com a ascensão da Alemanha. No final do século XX, a China começou a se erguer de um longo período de subjugação colonial. Em 1949, os comunistas chineses derrotaram os nacionalistas após uma guerra civil prolongada e implacável. Isso foi a culminação da luta para se livrar do jugo colonial aplicado no povo chinês, primeiro por várias potências europeias, e depois pelo Japão. Entre 1945 e 1949, grupos chineses com ideologias políticas conflitantes lutaram entre si pela hegemonia do país. Os comunistas, que emergiram vitoriosos, rapidamente estabeleceram um sistema de governança severo controlado centralmente que condenou a China a um período de desenvolvimento atrofiado e de supressão política.

Contudo, nos anos 70, uma nova geração de líderes começou a guiar a China em uma nova direção, depois da morte de Mao Tsé-Tung. A nova liderança buscou trazer mais prosperidade e crescimento econômico a China por meio de um capitalismo administrado pelo Estado. O comunismo não foi abandonado, porém muito dos seus mecanismos econômicos foram liberalizados e modificados para capacitar o crescimento, embora ainda supervisionado centralmente pelo partido. Isso levou à ascensão da China da estagnação e da pobreza a um nível sem precedentes de prosperidade econômica e de acentuada influência política no mundo. Já nos anos 90, o crescimento econômico anual de dois dígitos elevou a China para um lugar entre no primeiro nível das nações. Com o seu crescimento inacreditável veio a exigência da China por maior respeito.

De uma forma semelhante às preocupadas opiniões das nações vizinhas com relação à Alemanha na Europa pré-Primeira Guerra Mundial, no final da década de 90 os vizinhos da China começaram a ter medo que ela viesse a agredir as suas soberanias. As ações chinesas, como testes de mísseis perto do litoral de Taiwan, em 1996, e reivindicações sobre as Ilhas Spratly, que tiveram origens mais ou menos durante o mesmo tempo, têm alimentado esses temores8. Portanto, alguns Estados têm tomado medidas para proteger os seus interesses. Por exemplo, após um período de várias décadas de relações tépidas entre a Índia e os Estados Unidos, eles estão cultivando um forte relacionamento que inclui acordos econômicos e de segurança. Segundo Ted Galen Carpenter, iniciativas como essas fazem com que as autoridades chinesas acreditem que os Estados Unidos estão encabeçando “uma estratégia de contenção orientada contra a China”9.

Em resposta, a China contra-ataca essa presumida contenção por meio de uma reaproximação com a Rússia. Desde 2013, a China e a Rússia estão cooperando em benefício mútuo. Por exemplo, em 2013, elas assinaram um acordo de US$ 270 bilhões para dobrar a quantidade de petróleo russo enviado para a China. Em 2015, elas assinaram outro acordo em que a Rússia construiria um oleoduto para facilitar a entrega de gás natural da Sibéria10.

A China e a Rússia possuem uma longa história de antagonismo, da mesma forma que a Rússia e os Estados Unidos. Então, por que a China e a Rússia estão trabalhando juntos agora? Para a Rússia, um acordo econômico com a China oferece uma maneira de diminuir os efeitos opressivos das sanções econômicas impostas pelo Ocidente devido às ações severas na Ucrânia. Contudo, no caso da China, fazer vista grossa ao relacionamento adverso anterior com a Rússia parece oferecer uma forma de contrabalançar os Estados Unidos, e assim prover proteção contra a contenção11. Um paralelo histórico pode ser encontrado na tentativa alemã de enfrentar a Tríplice Entente com a Tríplice Aliança da Itália, da Áustria-Hungria e da Alemanha (bem como com uma aliança com o Império Otomano).

De fato, os paralelos entre a ascensão da Alemanha do século XIX e o surgimento moderno da China são altamente interessantes. Assim como a Alemanha emergiu como uma grande potência a partir de pequenas fontes dispersas, a China cresceu no século XX. Além disso, as alegações e as declarações feitas pelos governos delas são semelhantes. Por exemplo, durante uma reunião, de 2010, da Associação das Nações do Sudeste da Ásia, segundo o repórter John Pomfret da Washington Post, os participantes alegaram ouvir o ministro das relações exteriores chinês dizer, “A China é um grande país e outros países são pequenos”12. Se essa declaração reflete as atitudes prevalecentes, a exigência de respeito por parte da China combinada com alegações de hegemonia regional — que alguns têm rotulado como uma Doutrina de Monroe chinesa — soa como algo do passado13.

Uma consequência do poder da China é que as nações na sua fronteira, como as Filipinas, o Vietnã, a Coreia do Sul e o Japão, têm desenvolvido vínculos mais íntimos entre si. Além disso, a violação chinesa das rotas de navegação internacionais também aproximou os Estados Unidos desses países.

Embora atualmente não haja uma aliança formal ou tratados de segurança em vigor, a soma das relações mais íntimas entre os Estados Unidos e os vizinhos regionais da China leva alguns acadêmicos e líderes chineses a acreditarem que existe um esforço concentrado para conter a nação deles. De fato, como observado pelo autor Biwu Zhang, até existe a alegação feita por alguns acadêmicos chineses de que os Estados Unidos estão fomentando disputas entre a China e os seus vizinhos como uma forma para aumentar as dificuldades do país14. Mais uma vez, isso soa como algo do passado, quando as autoridades da Alemanha imperial chegaram a acreditar que a Entente estava cercando-os e que era necessário agir. Ao julgar mal as percepções alemãs, os militares, políticos e diplomatas da Entente fracassaram em evitar o cataclismo da Primeira Guerra Mundial em face de uma Alemanha ascendente. Será que as autoridades agirão de uma forma diferente para evitar um conflito com uma China renascente neste século?

O CMG Wang Jianxum, Vice-Chefe do Estado-Maior da Armada do Mar Meridional, do Exército de Libertação Popular (Marinha), e Comandante da Força-Tarefa de Escolta, proporciona uma visita na ponte do navio chinês Jinan ao C Alte John Fuller, Comandante da Região Naval Havaí e do Naval Surface Group Middle Pacific (Grupo da Armada Naval do Centro Pacífico) durante uma visita rotineira a Havaí, 13 Dez 15. (Sgt Nardel Gervacio, Marinha dos EUA)

Uma Proposta de Políticas para Melhores Relações com a China

Os exemplos da História talvez possam ajudar-nos a descobrir novas formas para repetir erros. As autoridades chinesas temem a contenção porque não querem que o país perca influência, fique estagnado, ou de alguma maneira, se torne submisso aos desejos e interesses de outras nações, como aconteceu antes de 1949. Tal futuro é impensável e intolerável para os chineses15. Portanto, como podem os Estados Unidos e outras nações da região Ásia-Pacífico mudar essa percepção entre os autoridades chineses?

Ashley J. Tellis da Fundação Carnegie para a Paz Internacional escreveu um excelente estudo com recomendações sólidas que podem evitar a disseminação entre as autoridades chinesas da percepção de que os Estados Unidos estão tentando implementar uma política de contenção. A sua abordagem aconselha a promoção de equilíbrio e de cooperação em vez da contenção. As suas recomendações principais aos formuladores de políticas para conseguir esse equilíbrio são apoiar os atores regionais, aprofundar seletivamente a globalização, reforçar as capacidades militares dos EUA e revigorar a economia dos EUA16.A implementação efetiva da política geral de equilíbrio e do amplo crescimento de Tellis deve ser apoiada com quatro elementos críticos: a transparência, o engajamento, a inclusão e a concordância de opinião17.

Por séculos, o equilíbrio de poder entre as grandes potências mundiais, estruturadas em blocos, foi facilitado por líderes políticos com a finalidade de manter a paz. Foi apenas após o Segunda Guerra Mundial que os Estados Unidos implementaram uma política de contenção para enfrentar a expansão da União Soviética.

A contenção, nesse caso, funcionou, o que não pode acontecer com a China. Primeiro, as economias chineses e norte-americanas estão inextricavelmente interconectadas. Em contraste com isso, durante a Guerra Fria, as economias norte-americanas e soviéticas estavam quase completamente separadas como parceiros comerciais em blocos ideológicos conflitantes. Segundo, a localização geopolítica da China faz com que a contenção seja extremamente problemática devido à sua centralidade na Bacia do Pacífico. Além disso, as ambições de expansão soviética estendiam por todo o mundo, enquanto que a China não necessariamente deseja a expansão, até mesmo em um nível regional. Na realidade, o que a China provavelmente quer é hegemonia regional e reconhecimento como a primeira nação no Pacífico. Portanto, a contenção da China adiantaria pouco uma vez que as suas ambições são limitadas a sua própria região18. Assim, o equilíbrio faz mais sentido do que a contenção, mas como pode funcionar?

O equilíbrio não significa a formação de um bloco de nações na Ásia para enfrentar a China por uma perspectiva militar ou econômica. Em vez disso, como Tellis observa, a criação de equilíbrio na Ásia “se concentraria principalmente em restringir a capacidade de Pequim de usar indevidamente as suas crescentes capacidades nacionais em maneiras que diminuem o poder norte-americano”19. Em vez de formar blocos conflitantes, o equilíbrio instigaria a China a conformar-se às normas internacionais. Para implementar uma estratégia de equilíbrio, os Estados Unidos precisam “apoiar os seus parceiros asiáticos, compensar as perdas ... [que os Estados Unidos têm] sofrido devido à participação da China no comércio global, reinvestir na manutenção da superioridade militar necessária para a efetiva projeção de poder dos EUA por todo o mundo e revitalizar a sua economia nacional”20.

Em resumo, o equilíbrio significa a reconstrução da força norte-americana ao mesmo tempo em que trabalha intimamente com amigos na região, fortalecendo-os e resolvendo os medos que esses possuem que podem causar enfrentamentos desnecessários. Assim, os Estados Unidos devem ser vistos como redirecionando a sua energia para solidificar a sua própria economia e fortalecer amigos ao invés de parecer estar buscando a contenção da China.

Para fazer com que uma estratégia de equilíbrio como essa funcione, os Estados Unidos precisam, primeiro, conduzir os seus esforços com 100% de transparência21. A transparência ajuda a formar confiança, e isso é a única forma para reduzir as suspeitas sustentadas pelos chineses. Portanto, os Estados Unidos devem fazer uma declaração absolutamente clara sobre sua política de equilíbrio, e sobre o seu apoio para o amplo crescimento de todas as nações da Bacia do Pacífico “para concretizar o seu potencial estratégico e aumentar a sua cooperação mútua” para o benefício de todos22. A política deve integrar todos os instrumentos do poder nacional, com um equilíbrio entre os elementos diplomáticos, militares, econômicos e de informações.

Segundo, Tellis observa, “os Estados Unidos (e os seus amigos) devem engajar a China em vários níveis, de forma bilateral e multilateral, “incluindo trocas industriais, sociais, militares e educacionais23. Na sua análise das percepções chinesas, Zhang descobriu uma mentalidade entre alguns acadêmicos chineses que pode traduzir um apoio para a abordagem exposta por Tellis. Isso sugere que pode haver uma oportunidade para conduzir engajamento significativo com os chineses sem instigar medo de um cerco24.

No entanto, os Estados Unidos precisam evitar a condução de engajamentos que, quando somados, demonstrem inconsistência na política geral. A inconsistência dá a aparência de fraqueza e de uma falta de integridade. Além disso, as Forças Armadas não devem parecer como a vanguarda das iniciativas de políticas, enquanto as preocupações diplomáticas, econômicas e de informações vêm atrás. Isso pode levar à interpretação errônea e à desconfiança, com autoridades chinesas protestando contra esforços bem-intencionados para construir relações e melhorar cooperação e parceria. Assim, o engajamento precisa ter uma mensagem clara, distribuída uniformemente por todos os elementos do poder nacional, com as Forças Armadas em apoio.

Terceiro, os Estados Unidos têm que incluir a China em todas as decisões internacionais e no desenvolvimento das políticas e protocolos mundiais25. Não se pode admitir que a China aja como um mero observador no cenário mundial.

Atualmente, a China tende a usar sua política de não intervenção nos assuntos internos de outras nações, para evitar a participação em eventos de manutenção da estabilidade global. A China, às vezes, fica de lado durante as crises mundiais, criticando outros que tentam trazer ordem do caos. Contudo, a China já não pode se reservar o direito de reclamar sem participação, se quer ganhar o respeito que almeja. Se a China quer respeito, deve ser chamada a tornar-se mais engajada na comunidade mundial. Ela deve ser incentivada a fazer parceria com outras nações para evitar ou estabilizar crises, para a melhoria de todos26. Tellis ressalta no seu estudo que os Estados Unidos precisam persuadir a China a aceitar isso.

Finalmente, apesar das inúmeras áreas de desacordo, Tellis identifica oportunidades em que a China, os seus vizinhos e os Estados Unidos podem trabalhar juntos. Entre eles, a cooperação no aprofundamento das transações comerciais e no combate ao terrorismo.

Todas as nações da região da Ásia-Pacífico se beneficiam imensamente pelo comércio entre si. A expansão desse entre as nações pode trazer recompensas para todos os participantes27. Além disso, a China, os Estados Unidos e os seus parceiros coletivamente permanecem vulneráveis aos grupos terroristas. Os Estados Unidos já aprenderam muitas lições ao longo da última década que podem ajudar a China, que possui uma ameaça significativa do Islã radical nas suas províncias no noroeste. Os dois países e outros na região podem fazer parceria para combater esse problema comum. Essa cooperação pode ajudar a derrubar barreiras, construir confiança e entendimento e evitar que a China interprete mal a intenção de outras nações.

Conclusão

A história não é um modelo que pode ser usada para prever eventos ou resultados específicos do futuro. Contudo, uma análise do passado pode revelar padrões pelos quais se pode avaliar os desafios atuais. Uma análise superficial dos eventos demonstra esquisitas semelhanças entre a Alemanha imperial do século passado e a China atual. Um sentimento de paranoia de ser cercada influenciou as autoridades alemãs, levando a passos errados que mergulharam o mundo em uma guerra devastadora. Com base na minha observação pessoal e em uma pesquisa de fontes publicadas, a China pode estar desenvolvendo uma ilusão de que os Estados Unidos estão liderando um esforço para contê-la. O perigo é que tal situação possa levar à avaliação errada e à reação exagerada — um conflito desnecessário.

O conflito é evitável se os Estados Unidos empregarem todos os instrumentos do poder nacional para conseguir um equilíbrio de poder em que a China não precisa ser cerceada. Uma política de equilíbrio deve fortalecer a economia dos EUA bem como a dos seus parceiros, manter o poder militar dos EUA e remover o foco de atenção da China. Fator inerente ao sucesso de tal política é a redução do sentimento entre as autoridades chinesas que os Estados Unidos estão tentando contê-la. Os Estados Unidos podem fazer isso ao comunicar claramente o seu desejo por um benefício mútuo.

A cultivação de um parceiro na China — junto com os amigos da região — em vez de um adversário pode evitar uma colisão que provavelmente seria devastadora para todos.

Referências

  1. Christopher Clark, Iron Kingdom: The Rise and Downfall of Prussia, 1600-1947 (Cambridge, MA: Harvard University Press, 2006), p. 510.
  2. Ibid., p. 531-33.
  3. Ibid., p. 542 e 545-46.
  4. Michael Sturmer, The German Empire, 1870-1918 (New York: The Modern Library, 2000), p. 15–24.
  5. Sturmer, The German Empire, 3–5; and Gordon Craig, Germany, 1866-1945 (New York: Oxford University Press, 1978), p. 33–34.
  6. Sturmer, The German Empire, p. xxi, 84–85, e 88–90; e Clark, Iron Kingdom, p. 553–55.
  7. Ashley J. Tellis, Balancing Without Containment: An American Strategy for Managing China (Washington, DC: Carnegie Endowment for International Peace, 2014), p. 3 e 13.
  8. John Thornhill, “China’s Neighbors Get Nervous” International Forum online, 2 Dec. 2002, acesso em: 12 mai. 2016, http://www.internationalforum.com/Articles/chinas%20neighbors%20get%20nervous%20by%20Thornhill.htm.
  9. Ted Galen Carpenter, “Is India the Latest Component of a U.S.-Led Encirclement Strategy against China?” Cato Institute website, 12 Feb. 2014, acesso em: 10 mai. 2016, http://www.cato.org/publications/commentary/india-latest-component-us.led-encirclement-strategy-against-china/.
  10. Denis Pinchuk, “Rosneft to Double Oil Flows to China in $270 Billion Deal,” Reuters online, 21 Jun. 2013, acesso em: 12 mai. 2016, http://www.reuters.com/article/us-rosneft-china-idUSBRE95K08820130621; e Edward C. Chow e Michael Lelyveld, “Russia-China Gas Deal and Redeal,” Center for Strategic & International Studies, 11 May 2015, acesso em: 13 mai. 2016, http://csis.org/publication/russia-china-gas-deal-and-redeal.
  11. Peter Harris, “The Geopolitics of Sino-Russian Rapprochement,” The Diplomat online, 11 Jul. 2014, acesso em: 12 May 2016, http://thediplomat.com/2014/07/the-geopolitics-of-sino-russian-rapprochement/; e Daniel Wagner, “Why the China/Russia Rapprochement Won’t Last,” Huffington Post website, modificado mais recentemente em: 10 jan. 2015, acesso em: 12 mai. 2016, http://www.huffingtonpost.com/daniel-wagner/china-russia-rapprochement_b_6133480.html.
  12. John Pomfret, “U.S. Takes a Tougher Tone With China,” Washington Post website, 30 Jul. 2010, acesso em: 10 mai. 2016, http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2010/07/29/AR2010072906416.html.
  13. Tellis, Balancing Without Containment, p. 5. Parece que Tellis tenha introduzido a ideia de que a política externa chinesa para os seus vizinhos é um tipo de Doutrina de Monroe.
  14. Biwu Zhang, “Chinese Perceptions of US Return to Southeast Asia and the Prospect of China’s Peaceful Rise,” Journal of Contemporary China 24(91) (2015): p. 185–87 e 189. doi:10.1080/10670564.2014.918419. O autor deste estudo observa que ele analisou 83 artigos e estudos de uma variedade de jornais acadêmicos chineses. Da mostra, 75 artigos adotaram uma posição negativa sobre as ações dos EUA que envolviam a China. Trinta e cinco desses adotaram uma posição de que os esforços dos EUA enfraqueceram a influência da China no Sudoeste Asiático ou pioraram a sua situação de segurança, sugerindo uma percepção prevalente de que a política dos EUA é orientada para minar a China.
  15. Ibid., p. 188.
  16. Tellis, Balancing Without Containment, p. x.
  17. Ibid., p. ix–x, 5-6, 38, 50 e 84.
  18. Ibid., p. 2, 24, 29–30 e 35–36.
  19. Ibid., p. 32.
  20. Ibid., p. 33.
  21. Ibid., p. 84.
  22. Ibid., p. 36.
  23. Ibid., p. 37.
  24. Zhang, “Chinese Perceptions of US Return to Southeast Asia,” p. 189-90. Zhang descobriu que 29 dos 83 artigos examinados apresentaram recomendações que a China se engaje com os Estados Unidos. Muitos deles sugerem uma abordagem semelhante à de Tellis.
  25. Tellis, Balancing Without Containment, p. 87.
  26. Ibid., p. 37-39.
  27. Ibid., p. 38-39 e 42-44.

O Coronel Michael J. Forsyth, do Exército dos EUA, é o Chefe de Estado-Maior da Região do Alasca do North American Aerospace Defense Command (NORAD ) e Comandante da Base Conjunta Elmendorf-Richardson. É mestre em Estudos Estratégicos pelo U. S. Army War College, e também possuíndo títulos de mestrado pela Escola de Estudos Militares Avançados e pela Louisiana State University. Serviu quatro rodízios em combate, um durante a Operação Desert Storm e três no Afeganistão. É autor de três livros sobre campanhas da Guerra Civil dos EUA.

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