Military Review

 

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Serviço seletivo

Antes da Força Totalmente Voluntária

 

Barry M. Stentiford, Ph.D.

 

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>Médico examina convocados em 21 de janeiro de 1919, em Camp Devens, Massachusetts

Ralph E. Rigby, Chief Warrant Officer 5NT1, foi convocado em 1972 e serviu continuamente no serviço ativo até 2014.1 Quando passou à reserva remunerada, rompeu-se o último vínculo entre a conscrição e o Exército estadunidense. Nenhum militar atualmente no Exército dos Estados Unidos da América (EUA) ou de qualquer Força Singular serviu com conscritos ou os comandou. Por outro lado, quando a conscrição foi eliminada em 1973, poucos militares tinham experiência com uma Força Totalmente Voluntária. As Forças Armadas dos EUA adotaram a Força Totalmente VoluntáriaNT2 (all-volunteer force, AVF) como uma alternativa ao uso da conscrição em tempos de paz para compensar o déficit no recrutamento. O 50o aniversário da AVF é um bom momento para refletirmos sobre o sistema de serviço militar obrigatório que foi substituído.

NT1: Oficial técnico sem equivalente no Exército Brasileiro.
NT2: Forças Armadas compostas totalmente de voluntários.

Os EUA usaram a conscrição — serviço militar obrigatório — quatro vezes durante o século XX, em um total de 35 anos. Depender de voluntários, em vez de usar o serviço seletivo para preencher as fileiras inferiores do Exército dos EUA em 1973, não introduziu algo novo na história militar do país. O serviço militar obrigatório no nível federal tem sido mais uma exceção do que a regra.2 Durante a maior parte de sua existência, o Exército regular existiu como um repositório de conhecimento militar em tempos de paz, em torno do qual se formaria um exército ampliado em tempos de guerra. No decorrer da maior parte do século XIX, a expansão em tempos de guerra ocorreu principalmente com a milícia ou com regimentos de voluntários organizados pelos estados.3 O Congresso autorizou a criação de regimentos federais temporários voluntários durante a guerra com a Espanha, em 1898, e as subsequentes guerras das Filipinas. A única experiência da nação com a conscrição antes de 1917, de 1863 a 1865, durante a Guerra Civil dos EUA, criou tantos problemas quanto tentou resolver. O surgimento da Guarda Nacional nas décadas que se seguiram à Guerra Civil, codificado por meio da Lei da Milícia (Militia Act) de 1903 e da Lei de Defesa Nacional (National Defense Act) de 1916, mudou esse paradigma.4 Ainda assim, os autores desses textos legislativos nunca imaginaram que a Guarda Nacional fosse suficiente para atender às demandas de efetivo previstas de uma grande guerra.

A nação desenvolveu um programa bem-sucedido de conscrição durante a Primeira Guerra Mundial. O Sistema de Serviço Seletivo forneceu o modelo básico de conscrição para a Segunda Guerra Mundial e o início da Guerra Fria. No final de 1940, a nação deu início à conscrição em tempos de paz como parte do chamado “Plano de Mobilização Protetora”(“Protective Mobilization Plan”). Esse plano foi substituído pela conscrição em tempos de guerra — “enquanto durasse a guerra mais seis meses” —, após o ataque japonês a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941.5 Esse tipo de convocação da época da Segunda Guerra Mundial durou até 1947. Em 1948, os EUA retomaram a convocação em tempos de paz quando ficou claro que os alistamentos voluntários não gerariam recrutas suficientes. Autorizada inicialmente por dois anos, o Congresso pretendia que essa convocação pós-Segunda Guerra Mundial fosse uma medida temporária antes da aprovação da legislação para o treinamento militar universal (universal military training, UMT). Essa legislação não avançou, e o Congresso reiniciou o serviço seletivo, inicialmente por dois anos, com a possibilidade de renovação. Essa conscrição de 1948 vigorou não apenas em tempos de paz, mas também durante a Guerra da Coreia (1950-1953) e a Guerra do Vietnã (1964-1973).

Cartão de alistamento na Segunda Guerra Mundial de Huddie Ledbetter

A primeira experiência dos estadunidenses com a conscrição federal ocorreu durante a Guerra Civil dos EUA (1861-1865) e foi, de forma geral, considerada um fracasso. Ambos os beligerantes empregaram alguma forma de convocação para preencher as fileiras de seus exércitos. O governo confederado iniciou a conscrição em 1862; o governo dos EUA iniciou a conscrição no ano seguinte, com a aprovação da Lei de Alistamento.6 Todos os homens brancos fisicamente aptos, com idade entre 20 e 45 anos, eram obrigados a se alistar. Nos estados que permaneceram leais à União, a lei de conscrição federal autorizava o Gabinete do chefe da Polícia do Exército a usar soldados para obrigar os homens elegíveis a servir nos regimentos de qualquer estado que não tivesse atingido sua cota de voluntários.7 Menos de 5% dos militares do Exército dos EUA ingressaram por conscrição. A lei autorizava que um homem pagasse USD 300 a um substituto para que fosse em seu lugar, permitindo que os mais ricos evitassem o serviço militar, e isso fomentava um mercado de homens dispostos a servir pelo preço certo. O uso de militares para obrigar ao serviço militar contrariava os ideais estadunidenses. A conscrição em si era vista como vergonhosa; os voluntários tendiam a desprezar os soldados convocados, considerando-os “preguiçosos que não eram confiáveis sob fogo” e que provavelmente desertariam.8 A oposição à conscrição detonou um tumulto de quatro dias na cidade de Nova York, em julho de 1863, que terminou com mortes e exigiu tropas federais para que fosse contido. Embora costume ser considerada um fracasso, a conscrição na Guerra Civil motivou os estados a redobrarem seus esforços para aumentar suas cotas designadas de soldados por meio de medidas voluntárias. Isso foi feito, em grande parte, pelo aumento dos incentivos para os voluntários na forma de pagamentos em dinheiro e bônus, e até mesmo concessões de terras após o fim do serviço militar.

Com o ingresso dos EUA na Primeira Guerra Mundial em abril de 1917, a nação precisou novamente de uma expansão enorme e rápida do Exército para gerar impacto no curso da guerra. Depois de estudar o fracasso da conscrição na Guerra Civil, o governo do Presidente Woodrow Wilson criou um novo sistema para evitar os erros anteriores.9 Embora os EUA houvessem declarado guerra contra a Alemanha em 6 de abril de 1917, foi somente em 19 de maio que Wilson assinou a Lei do Serviço Seletivo de 1917, que era bem diferente das leis de convocação anteriores.10 A autoridade constitucional para a conscrição vinha do texto que permitia ao Congresso “formar e apoiar exércitos”.11 Grupos anarquistas e socialistas, como o sindicato International Workers of the World, pediram que os homens se esquivassem do alistamento, argumentando que a conscrição era inconstitucional por violar a proteção da 13a Emenda Constitucional contra a “servidão involuntária”, mas a Suprema Corte decidiu, em 1918, que a Constituição não limitava a forma como o Congresso poderia formar exércitos.12 Essa decisão forneceu a base constitucional do serviço militar obrigatório para o restante do século.

O Presidente Franklin D. Roosevelt assina a Lei de Treinamento e Serviço Seletivo em 16 de setembro de 1940

A conscrição durante a Primeira Guerra Mundial refletia os ideais da era progressista.13 O movimento progressista do final do século XIX e início do século XX procurou usar a pesquisa científica e a tecnologia para criar uma sociedade mais racional e ordeira e corrigir os males da vida moderna. Além disso, muitos defensores acreditavam que a conscrição transformaria os homens em cidadãos melhores. Se o Exército tivesse dependido apenas de alistamentos voluntários, o ônus teria recaído mais pesadamente sobre as “classes melhores” patrióticas, permitindo que os egoístas e os não patriotas fugissem de suas obrigações cívicas. Muitos desses voluntários desempenhavam funções importantes na sociedade civil e na economia, e sua ausência devido ao serviço militar causou ineficiências. O serviço seletivo refletia um desejo bipartidário de uma sociedade ordeira e racional, o que significava aplicar métodos científicos para decidir quem combateria ou não. Os homens serviriam onde o governo precisasse deles, seja na fazenda, na indústria ou nas Forças Armadas. Conforme a lei de 1917, conselhos compostos por “amigos e vizinhos” — e não por oficiais militares — de cada alistado decidiriam quem seria obrigado a servir nas Forças Armadas. Em cada condado ou cidade do país, criou-se um Conselho de Serviço Seletivo, informalmente conhecido como Conselho de Convocação. Os membros nomeados para os conselhos eram, em teoria, civis locais respeitados em suas comunidades, homens e mulheres que poderiam avaliar cada alistado. A maioria dos membros não recebia remuneração. Na Carolina do Norte, para usar um exemplo, o Conselho de Defesa do estado cuidava para que os “homens certos” participassem dos conselhos de convocação — homens brancos das classes média e alta que apoiavam a estrutura de poder predominante no estado.14 Normalmente, dentre os membros do Conselho de Serviço Seletivo estavam políticos locais, autoridades de segurança pública, veteranos ilustres, autoridades escolares, profissionais de saúde, empresários e outros que eram conhecidos em suas comunidades e também conheciam bem as pessoas.

O alistamento no serviço seletivo para todos os homens com idade entre 21 e 30 anos teve início em 5 de junho de 1917. Em setembro de 1918, essa faixa etária foi ampliada para 18 a 45 anos. No fim, 24 milhões de homens se alistaram. Cerca de 3,5 milhões de homens não se alistaram durante a Primeira Guerra Mundial, o que os sujeitou a julgamento e condenação de acordo com a lei militar e não com a lei civil. A obrigação de alistamento se aplicava não apenas aos cidadãos, mas também aos estrangeiros residentes. Os membros dos Conselhos de Serviço Seletivo deveriam considerar a saúde física e mental, a inteligência, os antecedentes criminais e a formação acadêmica dos jovens em seu distrito. Deveriam considerar também a questão da dependência. O homem era filho único e tinha pais que dependeriam cada vez mais dele na velhice? Tinha esposa? Tinha filhos? Havia outras pessoas que dependessem dele para seu sustento? O que se buscava saber era se as pessoas empobreceriam ou se tornariam dependentes da comunidade enquanto o jovem servisse nas Forças Armadas ou, pior ainda, se viesse a morrer enquanto servisse.

Outro fator que pesava muito na decisão de quem serviria ou não era o papel de cada homem na economia. Certas habilidades e profissões eram consideradas tão importantes para a economia e para o esforço de guerra que a lei dispensou os trabalhadores que realizavam essas tarefas. Os fazendeiros e os funcionários de ferrovias, por exemplo, eram, em sua maioria, dispensados do serviço militar. Outros homens que trabalhavam em ofícios ou profissões consideradas essenciais para o esforço de guerra, como operadores de máquinas ou encanadores, também foram dispensados, pois suas habilidades seriam necessárias ao suprimento das ferramentas de guerra. Cerca de 100 mil homens foram isentos da conscrição durante a Primeira Guerra Mundial por trabalharem na construção naval, e isso gerou ressentimento ao se tornar público.15 Os alistados podiam solicitar o reconhecimento como objetores de consciência, mas para isso era necessário que o solicitante demonstrasse pertencer a uma denominação religiosa reconhecida com um credo pacifista consagrado, como a Sociedade de Amigos (Quakers) ou uma das várias seitas Amish. No entanto, esses homens não eram automaticamente dispensados, e alguns eram incorporados, sendo idealmente designados para cargos que não envolviam o porte de armas. Os membros de algumas denominações, como os huteritas, não receberam esse reconhecimento e foram duramente perseguidos. Um dos militares estadunidenses mais famosos da guerra, Sgt Alvin York, solicitou originalmente o status de objetor de consciência com base em suas crenças cristãs. O problema foi que sua igreja não tinha uma tradição de pacifismo. Ele se apresentou para incorporação enquanto seu caso estava sendo analisado, mas depois de conversar com o comandante de sua companhia, retirou seu pedido e tornou-se um infante.16 O sistema que considerava o pacifismo genuíno e comprovado tornou-se mais flexível durante a Segunda Guerra Mundial e a Guerra do Vietnã.

Homens formam fila para o alistamento militar

Com base no total da população masculina em idade militar de uma cidade ou condado, o Conselho de Serviço Seletivo deveria selecionar os mais aptos a servir para atingir sua cota. Os homens considerados mais qualificados para servir receberam a classificação A1 e um número. Os homens que se candidatavam ao serviço militar — o alistamento voluntário ainda era permitido até o verão de 1918 — eram contabilizados na cota. Em 20 de julho de 1917, foi realizado o primeiro de uma série de sorteios no estilo de loteria. Os homens com os números selecionados deveriam se apresentar em um dos campos de mobilização recém-criados no início de setembro. Inicialmente, cerca de 180 mil homens foram selecionados para servir, mas haveria mais chamados. Cerca de um em cada nove homens que se alistaram acabou sendo convocado.17 Os homens incorporados ao Exército por meio do serviço seletivo eram denominados selecionados, em vez de conscritos ou convocados.18 Os selecionados não estavam no Exército regular, na Guarda Nacional ou em algum tipo de reserva. Em vez disso, eram designados para o “Exército dos EUA” e não para algum de seus componentes. Os selecionados eram designados para todas as divisões do Exército e representavam pelo menos 25% dos militares das divisões oriundas da Guarda Nacional até 1918.19 A maioria, no entanto, seria designada para as novas divisões do Exército Nacional. Os selecionados designados para a Marinha ou o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) foram classificados como reservistas.

O Exército fundamentou seus apelos iniciais por selecionados em sua capacidade de oferecer instalações de treinamento e liderança adequadas para os novos militares. Novos campos de mobilização tiveram de ser construídos em todo o país para receber os selecionados, como o Camp Devens, em Massachusetts, e o Camp Knox, em Kentucky. Talvez mais importante do que a construção física dos campos, oficiais do Exército regular, alguns oficiais da Guarda Nacional e um pequeno número de oficiais da reserva tiveram de ser designados para os campos, e o grupo inicial de oficiais temporários do Exército Nacional teve de ser selecionado e treinado. Esses oficiais, juntamente com os graduados indispensáveis, tinham de chegar aos novos campos de mobilização antes dos selecionados. Quando o quadro de líderes instrutores e os selecionados estivessem reunidos, o processo de transformar civis em militares poderia começar. Esperava-se que os selecionados servissem na ativa até que não fossem mais necessários para o governo, o que costumava significar dispensa por ferimentos ou doenças ou, no máximo, em até seis meses após o fim da guerra. Os apelos do público estadunidense e de seus representantes eleitos pela dispensa logo após a assinatura do armistício, em 11 de novembro de 1918, significaram que pouquíssimos selecionados serviram por mais de dois anos durante a Primeira Guerra Mundial.

Cartaz de recrutamento para a Segunda Guerra Mundial, tentando apelar para o patriotismo, incentiva os homens a se alistarem em vez de serem convocados

O governo e o Exército entenderam que, para que o serviço seletivo tivesse sucesso, o conscrito precisava ser tratado de forma diferente de como era no passado. O uso do termo selecionado em vez de conscrito ou recrutado serviu, em parte, para enfatizar que o militar havia sido selecionado para servir e não forçado. O governo usou jornais e outras mídias para fazer com que o público e os próprios selecionados se orgulhassem de terem sido escolhidos para servir.20 Com o serviço seletivo, o serviço militar involuntário passou a ser visto como algo honroso. A cobertura dos selecionados, em particular, e do Exército ampliado em tempos de guerra, em geral, enfatizou a natureza fundamentalmente democrática das conscrições em tempos de guerra.21 Tradicionalmente, nos Exércitos de tempos de guerra dos EUA, a classe e a etnia eram muitas vezes os pilares sobre as quais se formavam os regimentos temporários. O serviço seletivo, em teoria, eliminaria as distinções étnicas e de classe que eram, com frequência, aparentes no Exército regular, na Guarda Nacional e nos antigos regimentos de voluntários. Na prática, o serviço seletivo incorporou uma porcentagem maior de homens das camadas mais baixas da sociedade. No entanto, homens com ensino médio e até mesmo superior e cujos antepassados já estavam no país antes da revolução serviram ao lado de homens com estudos, talvez, até a oitava série ou que haviam chegado ao país como imigrantes. Embora parte da narrativa sobre a natureza essencialmente democrática da conscrição fosse uma hipérbole, a realidade era que homens de partes muito diferentes da cultura estadunidense serviram juntos. A exceção eram os homens afro-americanos, que, embora sujeitos à conscrição, eram treinados em campos segregados e serviam em unidades segregadas.22

O armistício de 11 de novembro de 1918 levou à suspensão da conscrição. A maioria dos selecionados retornou à vida civil em poucos meses. Ao todo, o governo contabilizou 2.819.296 homens que haviam sido incorporados por meio do serviço seletivo.23 Pouco depois do fim da guerra, o Congresso desmantelou, em grande parte, o serviço seletivo. No entanto, o Congresso queria preservar algo do Exército de tempos de guerra, com a ideia de que, em uma futura grande guerra, o serviço seletivo seria novamente usado para preencher suas fileiras. Na Lei de Defesa Nacional de 1920, o Congresso criou a Reserva de Primeira Linha para preservar a estrutura do Exército Nacional na forma de um quadro de líderes instrutores. A Reserva de Primeira Linha consistia em unidades até o escalão batalhão que continham a maioria de seus oficiais com patentes de reserva, mas muito poucos, se é que havia algum, alistados. Essas unidades existiam para fornecer unidades parcialmente treinadas que, em uma emergência, poderiam se expandir rapidamente para a força de guerra usando o serviço seletivo e concluir seu treinamento.24 O uso do serviço seletivo para expandir as Forças Armadas durante a Primeira Guerra Mundial foi bem-sucedido e continuou servindo de modelo para a guerra seguinte. Com algumas modificações, principalmente no que diz respeito ao tempo de serviço que um selecionado tinha de servir, o modelo de serviço seletivo criado quando os EUA entraram na Primeira Guerra Mundial seria novamente útil ao país quando este voltasse a usar a conscrição como meio de guarnecer as Forças Armadas. O modelo seria mantido até 1973 e continua sendo o modelo para futuras conscrições.

Em 31 de julho de 1940, após as conquistas da Dinamarca, Noruega, Países Baixos e França pela Alemanha nazista, o Presidente Franklin D. Roosevelt implementou o Plano de Mobilização Protetora (Protective Mobilization Plan).25 De acordo com o Plano, o Congresso concedia ao Presidente a autoridade para ordenar que a Guarda Nacional e a Reserva de Primeira Linha entrassem no serviço federal ativo para um ano de treinamento. Ao mesmo tempo, as reservas da Marinha e do CFN também foram ativadas. O decreto foi promulgado em 31 de agosto. As primeiras unidades ingressaram no serviço ativo em 16 de setembro de 1940, e as últimas ingressaram no final de fevereiro de 1941.26 Simultaneamente à mobilização da Guarda Nacional e da reserva, o Congresso autorizou a retomada do serviço seletivo — a primeira convocação da nação em tempos de paz.27 Isso foi feito por meio da Lei de Treinamento e Serviço Seletivo (Selective Training and Service Act) de 1940. Essa lei criou uma estrutura mais sólida do que na Primeira Guerra Mundial, criando o Sistema de Serviço Seletivo, uma nova agência federal. Embora fosse um órgão civil, o chefe do Sistema de Serviço Seletivo era um oficial da ativa do Exército. Inicialmente, todos os homens de 21 a 35 anos de idade eram obrigados a se alistar, com serviço ativo obrigatório de 12 meses para os selecionados. Diferentemente da conscrição na Primeira Guerra Mundial, os tribunais civis, e não os militares, julgariam os que não se alistassem.

O Sistema de Serviço Seletivo durante a Segunda Guerra Mundial funcionou de forma semelhante ao da Primeira Guerra Mundial, embora os critérios de seleção fossem mais específicos.28 O serviço seletivo foi implementado para incorporar os selecionados ao serviço ativo, a fim de fazer com que o Exército regular, a Guarda Nacional e, especialmente, os batalhões da Reserva de Primeira Linha alcançassem o nível de efetivo de guerra. As divisões da Reserva de Primeira Linha seguiram para os campos de mobilização, dos quais alguns eram novos, enquanto outros foram reaproveitados da Primeira Guerra Mundial, e começaram a receber os selecionados para fins de treinamento. Os selecionados também foram designados para a Marinha e, por fim, para o CFN. Assim como os membros da Guarda Nacional e da reserva, os selecionados foram postos no serviço ativo para treinar intensamente, não para permitir que o governo de Roosevelt adotasse uma postura mais agressiva em relação ao Eixo. De acordo com a mobilização, os membros da Guarda Nacional, da reserva e os selecionados não deveriam ser desdobrados para fora das Américas, exceto para territórios dos EUA, como Havaí, Filipinas e Guam. Corrigindo um problema da Primeira Guerra Mundial, a lei federal garantiu que os selecionados pudessem retornar ao seu antigo emprego sem que perdessem benefícios.29

Os selecionados logo constituíram a maior parte do efetivo nas divisões que haviam feito parte da Reserva de Primeira Linha — as divisões de número 75 ou acima. Como o efetivo das companhias do Exército dos EUA em tempos de guerra era de cerca de 200 homens, quase três vezes o efetivo em tempos de paz, os selecionados logo passaram a representar a maior parte dos combatentes nos escalões inferiores das divisões do Exército regular e da Guarda Nacional. Assim como na Primeira Guerra Mundial, durante os anos de conscrição, os selecionados foram designados “sem componente”, o que significa que, independentemente da origem da divisão para a qual fossem designados, eles serviam no “Exército dos EUA” (Army of the United States, AUS)NT3, e não no Exército regular, na Guarda Nacional ou na reserva. O mesmo não valia para a Marinha ou o CFN, já que o Congresso não criou uma instituição como o AUS para a Marinha e, portanto, os selecionados nessas Forças Singulares foram novamente denominados “reservistas”. Os selecionados designados para as divisões do Exército regular e da Guarda Nacional inicialmente reclamaram que eram maltratados pelos militares que haviam ingressado de forma voluntária no serviço, mas, na segunda metade de 1941, os selecionados eram a maioria em todas as divisões do Exército regular e da Guarda Nacional e até mesmo a maioria em algumas divisões.30 A superioridade numérica dos selecionados tornou-se mais acentuada ao longo dos anos da guerra.

NT3: Para esclarecer o termo Army of the United States (AUS) neste contexto, veja Barry M. Stentiford, “The Army of the United States,” in Army Expansions: Augmenting the Regular Army during War (Fort Leavenworth, KS : Combat Studies Institute Press, Army University Press, 2021), https://www.armyupress.army.mil/Portals/7/combat-studies-institute/csi-books/Army%20Expansions%20Digital.pdf. O autor explica:

O sistema mais abrangente para ampliar temporariamente o Exército e, o que é mais importante, seu corpo de oficiais, adveio da criação do “Army of the United States” (AUS) em 1940. […] O AUS compreendia o Exército regular, a Reserva de Primeira Linha, a Guarda nacional (somente quando sob o serviço federal ativo) e todos os conscritos. Servia como o exército bastante ampliado para a guerra, preservando, em grande medida, a estrutura do Exército regular dentro dele.

 

Em julho de 1941, quando o ano de treinamento militar exigido pela Lei de Treinamento e Serviço Seletivo de 1940 já estava na metade, a Lei de Extensão de Serviço (Service Extension Act) estendeu por seis meses o tempo de permanência na ativa dos reservistas, membros da Guarda Nacional e selecionados, o que significava que teriam de servir por 18 meses em vez de um ano.31 A medida foi aprovada no Congresso por um único voto de diferença. Antes do ingresso dos EUA na guerra, quase 922 mil homens haviam sido conscritos. O ataque a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941 e as subsequentes declarações de guerra dos EUA significaram que todos os integrantes do Exército, da Marinha e do CFN, independentemente de como houvessem ingressado no serviço militar, teriam de servir enquanto durasse a guerra mais seis meses, a menos que fossem dispensados antes.32 Ao mesmo tempo, foram eliminadas as restrições geográficas ao emprego dos selecionados. A conscrição também incentivou mais homens a ingressar de forma voluntária, o que lhes conferia maior controle sobre o local onde serviriam e, assim, as Forças Aéreas do Exército, a Marinha e o CFN, bem como as Forças de Serviço do Exército, costumavam receber mais voluntários. A prática de permitir que os alistamentos voluntários continuassem foi considerada ineficiente, e os líderes militares pediram que acabasse. Assim, esses alistamentos foram encerrados em dezembro de 1942. No total, quase 12 milhões de homens entraram para as Forças Armadas por meio do serviço seletivo durante a Segunda Guerra Mundial, dos quais cerca de 8 milhões serviram no Exército. A autoridade para incorporar compulsoriamente homens às Forças Armadas continuou após a rendição da Alemanha e do Japão em 1945, com 183.383 homens conscritos em 1946.33

Militar da 12 Divisão Blindada monta guarda sobre um grupo de prisioneiros nazistas, por volta de abril de 1945

Os membros dos Conselhos de Serviço Seletivo eram como os da Primeira Guerra Mundial. Cinquenta e quatro conselhos estaduais, distritais e territoriais supervisionavam o sistema, enquanto a maior parte dos cerca de 184 mil membros do conselho servia em um dos 6.442 conselhos locais e 72 conselhos de recursos. Novamente, a maioria servia sem remuneração. Os conselhos atendiam a um condado ou cidade, com um conselho adicional para cada 30 mil habitantes. Os ajudantes gerais estaduais e territoriais desempenhavam um papel importante para garantir que o sistema funcionasse em seus respectivos estados ou territórios. O Gen Bda Lewis B. Hershey, que havia participado do planejamento da mobilização pré-guerra, foi confirmado como diretor em 31 de julho de 1941.34 Seu nome tornou-se sinônimo de Serviço Seletivo, pois ele supervisionaria o sistema até ser transferido em 1970.

Após o fim da guerra, o serviço seletivo funcionou de forma reduzida, enquanto se aguardavam decisões sobre o tamanho do setor militar do pós-guerra. O Presidente Harry S. Truman e líderes militares, como o Gen George C. Marshall, esperavam que o Congresso aprovasse uma legislação para o UMT, que exigiria que quase todos os homens de 18 anos servissem um ano no Exército.35 Após um ano de serviço ativo, a maioria seria designada para as reservas gerais, a menos que optasse por se alistar no Exército regular, na Marinha, no CFN, na Guarda Nacional ou na Reserva de Primeira Linha. Os homens das reservas gerais estariam sujeitos, por seis anos, à convocação para o serviço ativo em caso de guerra.36 No entanto, a oposição política ao UMT devido ao seu custo, utilidade, finalidade e à questão da segregação racial significava que a probabilidade de sua aprovação em 1947 ou 1948 era pequena.37 A possibilidade de os líderes afro-americanos se oporem a qualquer forma de serviço militar obrigatório em um exército segregado foi parte da razão pela qual Truman promulgou o Decreto 9981 em julho de 1948, proibindo a discriminação racial nas Forças Armadas.38

A autorização para a conscrição foi revogada pelo Congresso em 31 de março de 1947.39 No entanto, o recrutamento voluntário não foi capaz de levar o Exército a alcançar seu efetivo autorizado. Como medida paliativa, o Congresso aprovou a Lei do Serviço Seletivo de 1948, que inicialmente deveria vigorar por dois anos.40 Conforme a nova lei, os selecionados em tempos de paz deveriam servir por 21 meses na ativa, com a opção de servir por mais 12 meses na ativa ou 36 na reserva. Por outro lado, um homem sujeito à conscrição poderia se alistar voluntariamente no Exército regular, na Marinha, no CFN ou na Guarda Costeira por quatro anos, ou em um componente da reserva por seis, e não ser convocado. O Secretário do Exército expôs sua visão do Exército em tempos de paz e o papel do serviço seletivo em um artigo publicado na edição de outubro de 1948 da Military Review. Ele acreditava que, com base no recrutamento voluntário, o número de selecionados seria de cerca de 30 mil por mês.41 Truman e outros continuaram a esperar que o UMT fosse adotado e o serviço seletivo, encerrado. No entanto, as dificuldades políticas com o UMT não puderam ser superadas e, em vez disso, o Congresso estendeu continuamente o serviço seletivo até 1973. As convocações anuais iniciais eram reduzidas porque os alistamentos voluntários eram permitidos, e o serviço seletivo servia apenas para suprir as deficiências de recrutamento. Cerca de 20 mil homens foram convocados em 1948 e metade disso em 1949, muito longe dos milhões ou mais convocados por ano durante a Segunda Guerra Mundial. Quase todos os selecionados foram para o Exército.

O Exército em tempos de paz após a Segunda Guerra Mundial rompeu com a tradição estadunidense anterior, segundo a qual deveria ser grande. Como na Segunda Guerra Mundial, os selecionados foram designados sem componente e, tecnicamente, serviam no AUS. O Exército permanente em tempos de paz consistia em formações do Exército regular reforçadas com selecionados. A presença de selecionados nas divisões do Exército regular significava que o número de oficiais no serviço ativo tinha de ser ampliado além do número autorizado de oficiais para o Exército regular, que se baseava no número de alistados. Como resultado, muitos oficiais da ativa da Segunda Guerra Mundial até 1980 serviram em uma patente da reserva ou do AUS. A Guarda Nacional e a recém-criada Reserva do Exército dos EUA, que substituiu a Reserva de Primeira Linha, foram concebidas como uma reserva estratégica a ser mobilizada somente durante uma grande guerra. O alistamento voluntário no Exército regular era de três ou quatro anos, enquanto os soldados convocados serviam inicialmente por 21 meses, posteriormente estendidos para dois anos. Nas duas guerras mundiais, os selecionados eram obrigados a servir pelo tempo que o governo exigisse, mas não mais do que seis meses após o fim da guerra. Na conscrição pós-Segunda Guerra Mundial, a obrigação de dois anos de serviço para os selecionados permaneceu inalterada mesmo durante as guerras da Coreia e do Vietnã.

As convocações para o ano fiscal de 1949 foram inferiores a 10 mil porque as Forças Armadas, embora maiores do que as que existiam em tempos de paz, haviam encolhido muito desde o fim da guerra, e os alistamentos voluntários preenchiam a maioria das vagas. A decisão de Truman de defender a Coreia do Sul contra a invasão norte-coreana, iniciada em 25 de junho de 1950, levou a um grande aumento das convocações, com mais de meio milhão de homens conscritos em 1951.42 Muitas unidades mobilizadas da Guarda Nacional estavam muito abaixo do efetivo autorizado. Para que o Exército atingisse o efetivo necessário para combater na guerra e dissuadir os soviéticos de qualquer agressão na Europa, 1,5 milhão de homens foram convocados de 1950 a 1953.43 O Exército queria usar os selecionados para preencher as unidades do Exército regular e da Guarda Nacional abaixo do efetivo e para evitar que a guerra na Coreia absorvesse todas as forças de reserva dos EUA. Os líderes temiam que a guerra fosse uma finta antes de uma investida comunista maior na Europa Ocidental e, por isso, seis das divisões mobilizadas da Guarda Nacional serviram nos EUA como um reforço estratégico ou na Europa. As duas divisões da Guarda Nacional enviadas à Coreia ingressaram no combate perto do final de 1951, depois que a guerra alcançou um impasse.44 Durante todo o ano de 1952, os membros da Guarda Nacional foram transferidos dessas divisões e substituídos por selecionados.45

Logo se estabeleceu um padrão. Em tempos de paz, os alistamentos voluntários eram suficientes e as convocações anuais eram baixas. No início da década de 1960, o debate sobre o fim da conscrição tornou-se mais comum, pois a população de homens em idade militar continuava a crescer. Em 1954, logo após o fim dos combates na Guerra da Coreia, 54% dos homens incorporados eram selecionados. Em 1961, eram apenas 22%. Em 1964, logo antes de os EUA se envolverem de forma intensa no Vietnã, apenas 11% dos militares em serviço ativo eram conscritos. Como as cotas de convocação eram muito baixas, os Conselhos de Serviço Seletivo receberam uma série de motivos para permitir que os possíveis alistados adiassem ou evitassem a conscrição, como casamento, intenção de obter educação universitária, servir em outra Força e buscar carreiras consideradas importantes do ponto de vista econômico. Como resultado, a conscrição recaiu cada vez mais sobre os brancos pobres e, mais tarde, sobre os negros e outras minorias. As comunidades usavam as convocações para se livrar de ociosos e delinquentes menores, acreditando que a disciplina militar poderia reformá-los e, se isso não acontecesse, pelo menos não seriam mais um problema da comunidade. Por esses e outros motivos, alguns líderes militares e civis começaram a questionar a necessidade da conscrição. Segundo o argumento, se os padrões de inteligência fossem reduzidos e a remuneração dos alistados de fileiras inferiores aumentasse, a conscrição poderia ser totalmente eliminada em tempos de paz. Embora esse argumento tivesse algum mérito, ignorava a questão do custo financeiro adicional relativo ao aumento do pagamento para os alistados pela primeira vez em toda a força, o impacto da redução dos padrões de alistamento sobre a eficácia do combate e a influência que a conscrição desempenhava na motivação dos alistamentos voluntários.46

Os alistados da Guarda Nacional do Exército, estado da Flórida, entre outras Forças, prestam juramento às Forças Armadas perante o oficial executivo do U.S. Navy Blue Angels

Ao contrário da conscrição em tempos de guerra, os alistamentos voluntários continuaram durante todo o período pós-Segunda Guerra Mundial e, na maioria dos anos, a maior parte dos homens se alistava voluntariamente. A conscrição estimulou o alistamento voluntário no Exército regular, já que os selecionados tinham menos poder de decisão sobre o tipo de tarefa que lhes seria designada, enquanto os alistados voluntários tinham algum controle. Também inspirou muitos homens a se alistarem na Guarda Nacional ou na reserva de qualquer Força Singular. No entanto, os componentes da reserva acharam difícil recrutar ex-selecionados para suas fileiras, já que a maioria dos que haviam completado o serviço obrigatório tinha pouca vontade ou incentivos para continuar servindo em um componente da reserva. Ao mesmo tempo, quando as convocações caíram, como no final da década de 1950, menos homens procuraram se alistar na Guarda Nacional ou na reserva para evitar a convocação.47 As mulheres não estavam sujeitas à conscrição. No entanto, podiam integrar voluntariamente o Corpo Feminino do Exército (Women’s Army Corps) ou o Corpo de Enfermeiras do Exército (Army Nurse Corps), se fossem qualificadas. Quando a guerra no Vietnã envolveu cada vez mais profundamente as Forças Armadas, as convocações anuais aumentaram, atingindo o pico em 1966, com 382.010 incorporados. Como os selecionados tinham menos poder de decisão sobre onde serviriam, uma porcentagem maior acabou na infantaria, no Vietnã e em combate. Como resultado, os conscritos estavam super-representados entre as baixas. Em 1965, 28% das mortes em combate no Vietnã ocorreram entre conscritos; a porcentagem subiu para 34% em 1966 e 57% em 1967.48 O compromisso de dois anos dos conscritos criou ineficiências para o Exército durante a guerra. Após concluir o treinamento básico e os subsequentes, um militar convocado costumava ser enviado ao Vietnã por um ano. Ao retornar do Vietnã, tinha, em geral, cerca de oito meses de serviço obrigatório adicional, um período insuficiente para que fosse muito útil à sua unidade de recrutamento.

O movimento para acabar com a conscrição teve um longo período de gestação. O Exército vinha planejando seu fim havia mais de uma década, embora a guerra no Vietnã houvesse atrasado a implementação de um retorno à dependência total de alistamentos voluntários. O Presidente Richard M. Nixon percebeu a injustiça do sistema que, em grande parte, permitia que os homens de classe média evitassem o serviço militar e, assim, em 1969, substituiu muitos dos adiamentos do governo de Johnson por um retorno à loteria, em que, teoricamente, o ônus do serviço militar recairia igualmente sobre todos os homens fisicamente aptos. Alguns adiamentos permaneceram, para situações de dificuldades, certas ocupações, objetores de consciência, clérigos e estudantes de ensino médio e superior. O adiamento para estudantes era apenas temporário, e Nixon defendeu seu fim. Um dos resultados foi um grande aumento da oposição à guerra e, não por coincidência, à conscrição, nos campi universitários, já que agora era maior a probabilidade de convocação dos homens que estavam na faculdade. As manifestações contra a convocação tornaram-se comuns, ao mesmo tempo que a crescente oposição à guerra acabou com o consenso nacional sobre a conscrição. Estima-se que 210 mil homens estadunidenses resistiram às convocações durante a Guerra do Vietnã — um número que não destoa das guerras anteriores — e cerca de 30 mil emigraram, geralmente para o Canadá ou Suécia, para evitar a conscrição.49 Com o fim do envolvimento estadunidense na Guerra do Vietnã, o ímpeto de acabar com a convocação era plausível, pelo menos em tempos de paz. O Comitê Gates, criado por Nixon para estudar a questão, relatou que, com o aumento do salário e outras reformas, os recrutas voluntários poderiam ser atraídos em número suficiente para o Exército em tempos de paz.50

Em 1971, Nixon assinou uma legislação estabelecendo a AVF. Em setembro daquele ano, o Congresso estendeu a autoridade do governo para convocar até 1973, mas o fim estava próximo. O conceito da AVF foi originalmente concebido apenas como um processo para guarnecer as forças em tempos de paz, com o serviço seletivo mantido na estrutura para fornecer homens durante a guerra. A convocação em 1973 foi a mais baixa de todos os tempos, com 646 selecionados, e a autoridade para a conscrição terminou em junho, quando o Congresso não a prorrogou. O Sistema de Serviço Seletivo continuou existindo, embora de forma limitada.51 Com o fim das convocações, todo o serviço militar passou a ser voluntário, e todo o serviço era prestado em um componente específico: Exército regular, Guarda Nacional do Exército ou Reserva do Exército. A era da conscrição havia terminado, pelo menos para o Exército em tempos de paz. Em 1980, o Congresso aprovou uma legislação exigindo que todos os homens entre 18 e 26 anos de idade se registrassem no Serviço Seletivo. O retorno da conscrição continua sendo uma questão em aberto.


Referências

 

  1. Reshema Sherlock, “Last Continuously Serving Draftee Retires after 42 Years of Service”, Army.mil, 29 October 2014, acesso em 17 jul. 2023, https://www.army.mil/article/137112/last_continuously_serving_draftee_retires_after_42_years_of_service#:~:text=Begin!,1972%2C%20during%20the%20Vietnam%20era.
  2. O serviço obrigatório na milícia para quase todos os homens ingleses livres era a norma na maioria das colônias, embora, à medida que essas sociedades se tornaram maiores e mais complexas, a milícia atuou mais como um grupo do qual os homens poderiam ser obrigados a servir por meio de aliciamento ou pela força. Para saber mais sobre esse fenômeno, veja Jack S. Radabaugh, “The Militia of Colonial Massachusetts”, Military Affairs 18, no. 1 (1954): p. 1-18, https://doi.org/10.2307/1982703; Michael D. Doubler, I Am the Guard: A History of the Army National Guard, 1636-2000 (Washington, DC: U.S. Government Printing Office [GPO], 2001), p. 14-21; John K. Mahon, History of the Militia and National Guard (New York: Macmillan, 1983), p. 14-26; e Harold E. Selesky’s War and Society in Colonial Connecticut (New Haven, CT: Yale University Press, 1990), p. 3-47. Para o conceito federal de milícia, especialmente para seu papel federal, veja “Militia of the United States: An Act More Effectually to Provide for the National Defence by Establishing an [sic] Uniform Militia throughout the United States”, in U.S. Congress, U.S. Statutes at Large, Volume 1 (1789-1799), 1st through 5th Congress (Boston: Charles C. Little and James Brown, 1845), p. 271-74, acesso em 26 jun. 2023, https://www.loc.gov/item/llsl-v1/.
  3. Veja Army Expansions: Augmenting the Regular Army during War do autor deste artigo (Fort Leavenworth, KS: Combat Studies Institute Press, 2022), p. 21-55.
  4. “An Act to Promote the Efficiency of the Militia, and for Other Purposes”, Statutes at Large of the United States of America, 32, no. 1 (1904): p. 774-80; “An Act for Making Further and More Effectual Provisions for the National Defense, and for Other Purposes”, Statutes at Large of the United States of America 39, no. 1 (1917): p. 166-217.
  5. Selective Training and Service Act of 1940, 50a U.S.C. §§ 302-315 (amended 13 dez. 1941).
  6. “An Act for Enrolling and Calling Out the National Forces, and for Other Purposes”, Cong. Globe, 37th Cong. 3rd Sess., Ch. 74, 75 (3 March 1863). Para saber mais sobre o recrutamento da Guerra Civil, veja Marvin A. Kreidberg e Merton G. Henry, History of Military Mobilization in the United States Army, 1775-1945, Department of the Army Pamphlet 20-212 (Washington, DC: U.S. GPO, November 1955), p. 104-13, acesso em 26 jun. 2023, https://history.army.mil/html/books/104/104-10/CMH_Pub_104-10.pdf.
  7. James Geary, We Need Men: The Union Draft in the Civil War (Ithaca, NY: Northern Illinois University Press, 1991), p. 65-66.
  8. Ibid., p. 74.
  9. Veja Lewis B. Hershey, Outline of Historical Background of Selective Service (Washington, DC: U.S. GPO, 1960), p. 6-7. Grande parte da compreensão dos erros da convocação para a Guerra Civil foi compilada em um relatório do Gen James Oakes em 1866 e depois esquecida até a Primeira Guerra Mundial, quando foi redescoberta. Entre as recomendações de Oakes, não deveria haver substitutos ou recompensas para voluntários e, principalmente, que todo o processo deveria ser gerenciado e conduzido por civis no nível local.
  10. Selective Draft Act of 1917, Pub. L. No. 65-12, 40 Stat. 76 (1917).
  11. Outro apoio constitucional à conscrição vem da ideia da milícia federalizada, argumentando, de fato, que o militar conscrito é um miliciano federalizado. Entretanto, a conscrição federal desde a Guerra Civil não foi implementada por meio da estrutura da milícia estadual. Além disso, a milícia federalizada só pode “executar as Leis da União, suprimir Insurreições e repelir Invasões”. U.S. Const. art. I, § 8, cl. 12. Embora uma declaração de guerra seja indiscutivelmente um ato jurídico e, portanto, o envio de soldados conscritos para o exterior seja para “executar as Leis da União”, esse argumento não funcionaria em uma guerra não declarada, como na Coreia e no Vietnã. U.S. Const. art. I, § 8, cl. 15.
  12. Arver v. United States [Selective Draft Law Cases], 245 U.S. 366 (1918). A decisão baseou-se na história do serviço militar obrigatório nos períodos colonial e nacional, bem como no significado dos EUA como uma nação soberana, e também na redação da Constituição. Para ler uma opinião contrária, veja Leon Friedman, “Conscription and the Constitution: The Original Understanding”, Michigan Law Review 67, no. 8 (1969): p. 1493-1552. Friedman argumentou que a Suprema Corte cometeu um erro e que os fundadores da nação nunca tiveram a intenção de dar poderes ao governo federal para convocar homens para as Forças Armadas.
  13. A obra de referência sobre conscrição durante a Primeira Guerra Mundial é de Christopher Capozzola, Uncle Sam Wants You: World War I and the Making of the Modern American Citizen (Oxford: Oxford University Press, 2008).
  14. Nathan K. Finney, “’All War Arrangements Are but Schools in Patience’: The North Carolina Council of Defense and the Associational State, 1917-1919” (tese de doutorado, Duke University, 2022), p. 72-121, acesso em 26 jun. 2023, https://hdl.handle.net/10161/25249.
  15. Hershey, Outline of Historical Background of Selective Service, p. 8.
  16. Douglas V. Mastriano, Alvin York: A New Biography of the Hero of the Argonne (Lexington: University Press of Kentucky, 2014), p. 21-42. Chapter 3, “At War with the Army,” aborda a questão de se York acreditava que servir em combate alinhava-se à sua fé cristã.
  17. John S. D. Eisenhower e Joanne T. Eisenhower, Yanks: The Epic Story of the American Army in World War I (New York: Free Press, 2001), p. 25.
  18. Russell Weigley, History of the United States Army (New York: Macmillan, 1967), p. 372.
  19. Les Andrii Melnyk, “A True National Guard: The Development of the National Guard and Its Influence on Defense Legislation, 1915-1933” (tese de doutorado, City University of New York, 2004).
  20. John A. Boyd, “America’s Army of Democracy: The National Army, 1917-1919”, Army History, no 109 (Fall 2018): p. 11-12.
  21. Ibid.
  22. Para saber mais sobre a experiência dos afro-americanos no Serviço Seletivo e no Exército, veja Chad L. Williams, Torchbearers of Democracy: African American Soldiers in the World War I Era (Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2010), p. 52-60, 105-144.
  23. “Induction Statistics”, Selective Service System, acesso em 3 abr. 2023, https://www.sss.gov/history-and-records/induction-statistics/.
  24. Forrest L. Marion e Jon T. Hoffman, Forging a Total Force: The Evolution of the Guard and Reserve (Washington, DC: Office of the Secretary of Defense, 2018), p. 23.
  25. Mark Skinner Watson, Chief of Staff: Prewar Plan and Preparation (Washington, DC: U.S. Army Center of Military History, 1991), p. 26-30.
  26. Exec. Order No. 8530, 5 Fed. Reg. 3501 (4 September 1940).
  27. A obra de referência sobre conscrição após a Segunda Guerra Mundial é de George Q. Flynn, The Draft, 1940-1973 (Lawrence: University Press of Kansas, 1993), p. 88-258.
  28. Selective Training and Service Act of 1940 (aka Burke-Wadsworth Act), Public Law No. 76-783, 54 Stat. 885 (1940).
  29. Hershey, Outline of Historical Background of Selective Service, p. 10.
  30. Memorando para o Secretário Adjunto de Guerra, datado de 24 de outubro de 1941, na Ike Skelton Combined Arms Research Library. O memorando respondia a uma carta de um advogado de Nova York, Jacob Rubinoff, que listou uma série de fatores que Rubinoff acreditava estar reduzindo o moral dos homens nas divisões da Guarda Nacional. A atitude negativa dos selecionados em relação aos oficiais do Exército regular era um tema comum na literatura e nas memórias do pós-guerra, como no livro The Thin Red Line [NT—Essa obra deu origem ao filme intitulado “Além da Linha Vermelha”, no Brasil], de 1962, de autoria de James Jones, que serviu na 25a Divisão de Infantaria no teatro de operações do Pacífico.
  31. Service Extension Act of 1941, 50a U.S.C. § 352, 55 Stat. 626 (1941).
  32. Public Resolution No. 96, 76th Cong., 54 Stat. 858 (1940).
  33. “Induction Statistics”.
  34. Hershey, Outline of Historical Background of Selective Service, p. 12-13.
  35. Ibid., p. 165-66.
  36. Ibid., p. 39, 99.
  37. William A. Taylor, Every Citizen a Soldier: The Campaign for Universal Military Training after World War II (College Station: Texas A&M University Press, 2014), p. 1-12.
  38. “Executive Order Establishing the President’s Committee on Equality of Treatment and Opportunities in the Armed Services”, 26 July 1948; Executive Orders, 1862-2016; General Records of the United States Government, Records Group 11; National Archives at Washington, D.C., acesso em 2 ago. 2023, https://catalog.archives.gov/id/300009.
  39. Pub. L. No. 80-26, 61 Stat. 31 (1947).
  40. Hershey, Outline of Historical Background of Selective Service, p. 17.
  41. Kenneth C. Royal, “Selective Service 1948”, Military Review 28, no. 7 (October 1948): p. 3-11, reimpresso em Military Review 77, no. 1 (January-February 1997): p. 7-10.
  42. “Induction Statistics”.
  43. Brian McAllister Linn, Elvis’s Army: Cold War GIs and the Atomic Battlefield (Cambridge, MA: Harvard University Press, 2016), p. 168.
  44. A 40a e a 45a Divisões de Infantaria serviram na Coreia, enquanto a 28a e a 43a serviram na Alemanha. A 31a, 37a, 44a e 47a permaneceram em serviço ativo no território continental dos EUA.
  45. William M. Donnelly, Under Army Orders: The Army National Guard during the Korean War (College Station: Texas A&M University Press, 2001), p. 89-122.
  46. Robert K. Griffith Jr., The U.S. Army’s Transition to the All-Volunteer Force, 1968-1975 (Washington, DC: U.S. Army Center of Military History, 1997), p. 9-10.
  47. Annual Report of the Chief, National Guard Bureau, Fiscal Year Ending 30 June 1959 (Washington, DC: U.S. Government Printing Office, 1959), p. 33.
  48. Griffith, The U.S. Army’s Transition to the All-Volunteer Force, p. 11.
  49. Lawrence M. Baskir e William A. Strauss, Chance and Circumstance: The Draft, the War, and the Vietnam Generation (New York: Random House, 1978), p. 169.
  50. Ibid., p. 35-36.
  51. Ibid., p. 29-33.

 

Barry M. Stentiford, Ph.D., é bacharel em História pelo College of Great Falls, mestre em História dos EUA pela University of Montana, mestre em Estudos Estratégicos pelo U.S. Army War College e doutor em História Militar pela University of Alabama. Formou-se pelo Air War College Distance Learning Program e pelo U.S. Army Command and General Staff College. Lecionou por 11 anos em uma universidade civil antes de integrar o corpo docente da School of Advanced Military Studies em Fort Leavenworth, Kansas, em 2009. Tem como foco acadêmico as forças não regulares dos EUA. Serviu na Força Aérea, na Guarda Nacional do Exército e na Reserva do Exército dos EUA, passando para a reserva remunerada com o posto de coronel.

 

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