Lições aprendidas pelo 75o Regimento Ranger durante 20 anos de atendimento pré-hospitalar tático
Cel Ryan M. Knight, Exército dos EUA
Cel (Res) Russ S. Kotwal, Exército dos EUA
Ten Cel Charles H. Moore, Exército dos EUA*
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Desde o fim da década de 1990, o 75o Regimento Ranger tem sido um líder e forte defensor da promoção do atendimento pré-hospitalar tático, ou APH Tático (tactical combat casualty care, TCCC). Como pioneiro, o Regimento Ranger adaptou o APH Tático para melhor apoiar a missão dos rangers, bem como a intenção do comandante do Regimento. Em toda a organização, enfatizou-se a responsabilidade do comando sobre o sistema de resposta aos feridos, o domínio onipresente dos fundamentos do APH Tático por socorristas médicos e não médicos e a proficiência dos profissionais de saúde nas práticas mais recentes da medicina de emergência e do atendimento de trauma.1 O atendimento pré-hospitalar tático foi um esforço de equipe. O objetivo era reduzir a morbidade e a mortalidade no campo de batalha e, principalmente, eliminar a morte pré-hospitalar evitável.
Entre os militares estadunidenses mortos nos primeiros dez anos do conflito no Afeganistão e Iraque, aproximadamente 24% tiveram ferimentos que foram considerados com possível capacidade de sobrevivência.2 As determinações sobre a capacidade de sobrevivência aos ferimentos baseiam-se em circunstâncias ideais, no conhecimento instantâneo de todas as lesões e na disponibilidade imediata de capacidades ilimitadas para traumas de nível I. As tendências na capacidade de sobrevivência aos ferimentos podem ajudar médicos e pesquisadores a identificar oportunidades de melhorias na medicina diagnóstica e terapêutica, tanto para o ambiente pré-hospitalar quanto para o hospitalar.
Não houve nenhuma morte pré-hospitalar evitável entre as sofridas pelo Regimento Ranger ao longo de 20 anos de operações de combate.3 As determinações sobre a capacidade de prevenção de mortes baseiam-se nas circunstâncias presentes e do mundo real, nos impactos táticos do ambiente e do inimigo e em outros fatores relevantes que imponham limitações significativas ao atendimento ideal e em tempo hábil. As tendências na capacidade de prevenção de mortes podem ajudar as equipes médicas e não médicas a identificar oportunidades de melhoria das táticas, técnicas e procedimentos (TTPs), equipamentos de proteção individual, e evacuação e atendimento aos feridos.
A missão do 75o Regimento Ranger é executar missões conjuntas de operações especiais em apoio às políticas e aos objetivos dos Estados Unidos da América (EUA). O Regimento é também considerado a principal força de incursão do Exército.4 As capacidades do Regimento incluem incursões aeroterrestres, ataques aéreos e outras incursões de ação direta para tomar acidentes capitais, destruir instalações estratégicas e capturar ou neutralizar forças inimigas. Os rangers são treinados para realizar ataques, emboscadas e outras missões em todos os níveis, de operações de escalão esquadrão até regimento.
A tabela de organização e equipamento do 75o Regimento Ranger é semelhante ao de uma brigada de infantaria leve padrão, e seus batalhões são comparáveis aos batalhões de infantaria leve. Assim sendo, as lições aprendidas e as melhores práticas do Regimento Ranger podem ser prontamente aplicadas a organizações semelhantes do Exército e do Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) dos EUA. Além disso, fora dessas organizações, a filosofia e os princípios do Regimento são pertinentes a todas as unidades do Departamento de Defesa dos EUA que se preparam para operações de combate e as conduzem.
O 75o Regimento Ranger é composto por um comando regimental, um batalhão de tropas especiais, um batalhão de inteligência militar e três batalhões de fuzileiros. Atualmente, o Regimento Ranger conta com um total de seis médicos, cinco assistentes médicos e 122 paramédicos para prestar apoio a um efetivo de quase 4 mil militares. O comando regimental, o batalhão de tropas especiais e cada batalhão de fuzileiros têm um médico, um assistente médico e paramédicos. O batalhão de inteligência militar tem um médico e um paramédico sênior. O comando regimental conta com quatro paramédicos e tem a função principal de assessorar e apoiar as operações e o treinamento do batalhão. O batalhão de tropas especiais tem 27 paramédicos, e cada batalhão de fuzileiros tem 30 paramédicos. A equipe médica do comando regimental presta apoio ao seu pessoal e também suplementa os batalhões, conforme determinado pela missão. A equipe médica do batalhão de tropas especiais apoia o efetivo e a missão do batalhão. Cada batalhão de fuzileiros tem 14 paramédicos da companhia do comando. Seis desses paramédicos são mantidos centralmente, e oito paramédicos da equipe de ambulância e do esquadrão de tratamento são alinhados funcionalmente como dois paramédicos adicionais para cada uma das quatro companhias de fuzileiros. Cada uma das quatro companhias de fuzileiros conta com quatro paramédicos designados, um paramédico sênior da companhia e um paramédico para cada um dos três pelotões. A equipe médica da companhia do comando do batalhão presta apoio ao seu efetivo, bem como suplementa os requisitos operacionais do batalhão e da companhia na linha de frente, conforme determinado pela missão. Todos os paramédicos designados para o 75o Regimento Ranger são treinados até o nível de profissionais táticos avançados (Advanced Tactical Practitioners), um paramédico tático, como qualificação militar de paramédico de combate de operações especiais (68W, W1 Special Operations Combat Medics).NT Esses rangers paramédicos são a continuidade e o núcleo do sistema de resposta aos feridos. São os representantes do padrão organizacional do APH Tático.
NT: A classificação 68W corresponde aos paramédicos de combate do Exército que prestam atendimento médico de emergência no local de ocorrência da lesão. W1 é a subclassificação aplicável ao 68W que concluiu o curso de paramédico de combate de operações especiais.
As lições aprendidas e as práticas recomendadas para o atendimento aos feridos dos rangers aplicam-se não apenas a outras unidades militares que conduzam operações de combate, mas também a unidades militares que conduzam operações que não sejam de combate. Além disso, esses princípios podem ser aplicados no setor civil para ocorrências adversas com feridos, como colisões de veículos, quedas, tiroteios, bombardeios e desastres naturais.
O foco dos rangers em obter o domínio dos fundamentos — que incluem as cinco prioridades de tiro, treinamento físico, treinamento médico, táticas de frações e mobilidade — criou uma força letal, porém capaz de salvar vidas, que tem tido êxito no cumprimento da missão operativo ao mesmo tempo que reduz as mortes evitáveis entre os rangers feridos. Um ciclo contínuo de esforços de melhoria de desempenho, incluindo a captação e análise de dados e a comunicação rotineira de estatísticas e tendências de baixas, é fundamental para o avanço de novas técnicas diagnósticas e terapêuticas e para a avaliação e o aperfeiçoamento de TTPs, equipamentos de proteção individual e sistemas de resposta e atendimento aos feridos. Esses esforços de melhoria de desempenho identificam lacunas e promovem mudanças quantificáveis que salvam vidas. Os dados objetivos e as recomendações subsequentes baseadas em evidências podem ser usados para adquirir recursos com eficiência, aperfeiçoar iniciativas de pessoal, treinamento e equipamento, além de orientar os esforços de modernização e pesquisa da Força. A coleta e análise de dados para a melhoria do desempenho apresentam um bom custo-benefício, pois fundamentam as decisões e justificam os gastos de tempo e verbas.
Taxa de mortalidade é a medida do número de mortes em uma população específica e que é dimensionada conforme o tamanho da população por unidade de tempo. Taxa de letalidade (case fatality rate, CFR) é a fração de um grupo exposto, ou uma proporção de uma população, diagnosticada com uma determinada doença ou lesão que acaba morrendo em decorrência dessa doença ou lesão. Para o atendimento aos feridos em combate das forças militares, a CFR é uma estatística resumida que oferece uma medida da letalidade geral do campo de batalha entre os militares que sofrem ferimentos em combate.5 A CFR pode ajudar a avaliar a qualidade do sistema de resposta aos feridos de uma unidade e oferecer contexto para as tendências em capacidade de sobrevivência a lesões e prevenção de mortes. Os mortos em combate (killed in action, KIA) são definidos como feridos em combate que morrem no ambiente pré-hospitalar no nível da unidade. Mortos por ferimentos (died of wounds, DOW) são feridos em combate que morrem após chegar a uma instalação com capacidade cirúrgica (por exemplo, instalação cirúrgica em posição avançada, hospital de apoio ao combate, hospital continental ou no exterior). A CFR pode ser calculada considerando o número total de KIA e DOW, dividindo esse número pelo número total de baixas com ferimentos de combate que inclua KIA e feridos em combate (wounded in action, WIA), tanto sobreviventes quanto DOW, multiplicando-se esse quociente por 100:
CFR = (KIA + DOW / KIA + WIA [sobreviventes + DOW]) x 100
De 2001 a 2021, as Forças Armadas dos EUA alcançaram uma CFR acumulada de 9,5, ou seja, 9,5 mortes para cada cem feridos em combate, em operações de combate no Afeganistão e no Iraque.6 No mesmo período, o Regimento Ranger teve uma CFR acumulada menor, de 7,6.7 A diferença entre esses dois números não é estatisticamente significativa, mas equivale a 15 vidas. Em outras palavras, além das vidas de rangers salvas pelo avanço dos esforços coletivos das Forças Armadas dos EUA e do Regimento Ranger como um todo, até 15 rangers adicionais podem estar vivos hoje graças a aspectos exclusivos do sistema de resposta aos feridos, conforme estabelecido, mantido e promovido pelo Regimento Ranger.
Discussão
Vários fatores podem ter contribuído para a CFR menor alcançada pelo Regimento Ranger. O Regimento tem um histórico de promoção da medicina pré-hospitalar no campo de batalha, atuando como um dos primeiros a adotar medicina inovadora de emergência e trauma e trabalhando para aplicar os esforços nos sistemas de trauma do Departamento de Defesa e civis.8 Além disso, os comandantes de comandos combatentes e outros líderes não médicos do Regimento reconheceram e continuam a reconhecer a importância de priorizar o atendimento aos feridos em combate.9 O treinamento médico inicial e de manutenção, com avaliações de competência em cada ciclo de treinamento de prontidão operacional de nove meses, desenvolve e mantém o conhecimento, as habilidades e as capacidades de socorristas médicos e não médicos em toda a organização. Além do treinamento individual, o treinamento coletivo da unidade e a integração do atendimento e da evacuação de feridos em cada conduta de combate promovem uma equipe coesa e o domínio dos fundamentos por meio de ensaios, repetição e condicionamento.
Podem ser extraídas do Regimento Ranger várias TTPs e procedimentos operacionais padrão que provavelmente contribuíram para que a unidade mantivesse zero mortes pré-hospitalares evitáveis durante operações de combate. Os autores supõem que quatro princípios-chave são essenciais para a promoção do sistema de atendimento pré-hospitalar tático do Regimento e fundamentais para o sucesso da unidade. Esses princípios não são específicos ao combate contraterrorismo e serão imprescindíveis e aplicáveis ao atendimento de feridos em vários ambientes, intensidades e escalas de combate no futuro. O Regimento Ranger tem enfatizado e deve continuar a enfatizar (1) o domínio dos fundamentos, mediante o treinamento em APH Tático para Todos, que inclui ênfase no controle imediato de hemorragias, (2) a ressuscitação com produtos sanguíneos nas posições mais avançadas, (3) um sistema de resposta aos feridos controlado e dirigido pelo comando e (4) o planejamento médico tático.
Domínio dos fundamentos — APH Tático para Todos
Integrando as melhores práticas da literatura médica contemporânea e as lições aprendidas em guerras e conflitos anteriores, as Forças Armadas dos EUA obtiveram um progresso significativo ao atingir a CFR acumulada mais recente de 9,5 para os conflitos no Afeganistão e no Iraque.10 Em comparação, essa taxa é significativamente inferior às CFR anteriormente divulgadas de 19,1 para a Segunda Guerra Mundial e 15,8 para a Guerra do Vietnã.11 O Regimento Ranger obteve uma CFR ainda mais baixa, de 7,6, para os conflitos no Afeganistão e no Iraque.12 O domínio dos fundamentos de APH Tático por todos os rangers, e não apenas pelos paramédicos, foi um fator notável que contribuiu para essa CFR baixa. O comandante do Regimento determinou e continua determinando que todos os rangers mantenham o treinamento e a proficiência médica como uma das cinco prioridades básicas do esforço. Ele exige que o treinamento em APH Tático seja intencional, planejado e integrado em todos os ciclos de treinamento e, posteriormente, verifica esse tempo de treinamento dedicado durante o briefing trimestral sobre treinamento com cada comandante de companhia. A adesão e o progresso são verificados durante os briefings do comando e do estado-maior, pois os comandantes de batalhão devem informar a porcentagem de rangers treinados em APH Tático como parte das estatísticas de prontidão médica de combate real da unidade. Esse treinamento médico baseia-se no curso APH Tático para Todos os Militares (TCCC for All Service Members) do Joint Trauma System e da Defense Health Agency e enfatiza as melhores práticas e diretrizes baseadas em evidências para o atendimento pré-hospitalar de trauma no campo de batalha, como o controle imediato de hemorragias com o uso de torniquetes, ataduras e curativos hemostáticos, bem como outros cuidados de APH Tático para si mesmo e para companheiros.13 Isso teve início em 1997 e foi codificado no programa de ranger socorrista (Ranger First Responder) e no sistema dos rangers para resposta aos feridos (Ranger Casualty Response System). O programa de rangers socorristas avançados (Advanced Ranger First Responder) foi criado em 2016 e, desde então, tem treinado não paramédicos em habilidades médicas avançadas além do escopo do treinamento Combat Lifesaver para ampliar os profissionais da área médica e os cuidados médicos no campo de batalha.
O treinamento em APH Tático para Todos, incluindo não paramédicos, paramédicos e profissionais da área médica, é feito da forma mais realista possível, por meio de simulação de combate, e responsabiliza cada ranger e comandante pela proficiência em APH Tático e habilidades médicas. No Regimento Ranger, os princípios e práticas de resposta e atendimento aos feridos são praticados e treinados em todo o sistema, desde o local de ocorrência da lesão até a evacuação do ferido e o atendimento cirúrgico. Esse treinamento é um componente essencial das condutas de combate, com simulações de ferimentos em cenários realistas durante a realização de exercícios de tiro real em pelotão ou manobras semelhantes, e inclui autoatendimentos, atendimento de companheiros e tratamento por paramédicos e outros profissionais de saúde. Esse treinamento enfatiza a resposta aos feridos em qualquer fase da operação, em vez de se concentrar nas baixas após o treinamento. Esse domínio dos fundamentos e o uso de treinamento e ensaios realistas são necessários para promover e oferecer um atendimento mais sofisticado aos feridos no local de ocorrência da lesão por parte dos rangers paramédicos e dos rangers socorristas avançados. Os graduados e oficiais mais antigos avaliam os graduados e oficiais subalternos e o sistema de resposta aos feridos de sua unidade, enfatizando o controle pelo comando e uma abordagem de equipe em cenários de baixas.
Mediante o domínio dos fundamentos, o treinamento realista e os ensaios, os socorristas e comandantes, médicos e não médicos não têm de apenas torcer que tudo corra bem; estão à altura do desafio. Todos foram treinados para o que é esperado e também para esperar o inesperado. Eles preveem baixas e lesões, especialmente lesões hemorrágicas, em todas as fases da missão. São também condicionados a oferecer controle de hemorragia e outros atendimentos de emergência e trauma urgentes que salvam vidas. No caso de episódios de trauma que resultem em lesões graves e críticas, a redução do tempo até o atendimento médico necessário é essencial para reduzir a morbidade e a mortalidade. Fornecer controle de hemorragia e outros cuidados básicos de trauma em tempo hábil é obrigatório no campo de batalha.
Ressuscitação com produtos sanguíneos
A hemorragia tem sido, e provavelmente continuará sendo, o mecanismo de morte mais predominante entre as mortes por ferimento com possível capacidade de sobrevivência no campo de batalha.14 Imprescindível à sobrevivência é o controle rápido da hemorragia e a reposição do sangue perdido. A literatura médica e de trauma continua a validar ainda mais a necessidade e o benefício da ressuscitação precoce com produtos sanguíneos sobre a mortalidade, ao mesmo tempo que demonstra os danos da ressuscitação com cristaloides (fluidos claros, como soro fisiológico) em pacientes de trauma.15 Os rangers paramédicos têm transportado produtos sanguíneos em missões de combate, incluindo plasma pulverizado a frio (freeze-dried plasma) desde 2011 e sangue total armazenado a frio desde 2014.16 Além do plasma pulverizado a frio e do sangue total armazenado a frio, esses produtos sanguíneos capazes de salvar vidas também incluem o concentrado de hemácias e o plasma líquido. O Regimento Ranger treinou, validou e ensaiou as indicações e os procedimentos de implementação da ressuscitação com produtos sanguíneos em todo o sistema de resposta aos feridos, incluindo o programa de transfusão de sangue total entre companheiros (Ranger O Low Titer, ROLO Whole Blood). A capacidade dos rangers paramédicos de transportar os feridos em combate e iniciar a ressuscitação com sangue total e outros produtos sanguíneos no local de ocorrência da lesão ou próximo a ele, poucos minutos após o ferimento, teve um impacto sobre o atendimento e a mortalidade de feridos em combate do Regimento. A ressuscitação com sangue total e produtos sanguíneos em tempo hábil é de suma importância para eliminar as mortes evitáveis em combate e reduzir as taxas de letalidade.
Sistema de resposta aos feridos controlado e dirigido pelo comando
Conforme descrito pelo Gen Stanley McChrystal, pelo Command Sgt. Maj. Mike Hall e outros em um artigo de 2017, a eliminação de mortes evitáveis em combate é uma questão organizacional que exige liderança tanto de líderes médicos quanto não médicos.17 Responsabilidade, prestação de contas e responsabilização são características fundamentais da liderança, essenciais para o sucesso e o avanço das organizações e para a abundância de esforços dentro dessas organizações. Os líderes determinam as prioridades, definem os padrões e, em seguida, monitoram e exigem a observância desses padrões. Líderes eficazes transmitem sua visão aos subordinados e criam um entendimento compartilhado de adesão e responsabilidade em todos os níveis, o que impulsiona a inovação e o aperfeiçoamento.
Líderes eficazes transmitem sua visão aos subordinados e criam um entendimento compartilhado de adesão e responsabilidade em todos os níveis, o que impulsiona a inovação e o aperfeiçoamento.
A direção e a supervisão do comando, incluindo a alocação de tempo, verbas e pessoal, exemplificam onde a prioridade do esforço e a prestação de contas é colocada. O atendimento pré-hospitalar tático deve incluir treinamento dedicado e planejado, que seja formalmente programado. As organizações devem alocar recursos, inclusive tempo, para apoiar o treinamento médico realista, em vez de depender apenas de períodos informais de instrução, como um treinamento realizado de forma improvisada caso haja tempo extra disponível. Atualmente, o treinamento controlado e dirigido pelo comando do 75o Regimento Ranger em cada ciclo de treinamento de prontidão operacional inclui três dias de ranger socorrista (APH Tático para Todos), duas semanas de ranger socorrista avançado (para pelo menos um infante por esquadrão) e duas semanas de avaliação e validação de ranger paramédico (Ranger Medic Assessment and Validation) para todos os rangers paramédicos.18 Esse treinamento médico se concentra no aprendizado prático repetitivo para o domínio dos fundamentos antes de aplicá-los a simulações realistas usando moulage em companheiros rangers como modelos de treinamento, em vez de manequins. Os comandantes também priorizam o atendimento aos feridos em combate, alocando verbas para treinamento médico e modernização. Os líderes médicos dos rangers podem, então, planejar e oferecer treinamentos realistas, com o apoio de rangers não médicos encarregados, alocados pelo comandante por meio dessa priorização do treinamento médico. Além disso, os líderes médicos dos rangers podem modernizar os itens de consumo no ritmo da medicina por meio dessa alocação de verbas.
O Regimento Ranger deve estar sempre pronto do ponto de vista operacional para agir imediatamente. Portanto, a proficiência e o domínio do treinamento médico devem ser continuamente enfatizados e mantidos para atender a essa exigência sempre presente. A organização desenvolveu e instituiu padrões para o treinamento médico de pessoal não médico, pessoal médico e de líderes. A liderança médica do Regimento manteve um processo de melhoria de desempenho para reunir continuamente as lições aprendidas, aperfeiçoar a educação e o treinamento e padronizar e aprimorar o atendimento. Em última análise, a proficiência médica e o domínio dos fundamentos por todos correspondem à compreensão, ao treinamento e ao ensaio, por cada ranger, de seu papel individual e coletivo no processo de tratamento e evacuação de feridos. Isso resulta em um Sistema do Regimento de Resposta aos Feridos (Regimental Casualty Response System) em que cada ranger e cada equipe de rangers usa o potencial máximo de seu nível de treinamento e experiência.
Planejamento médico tático
É de se esperar que ocorram baixas durante operações de combate. Um plano deve ser elaborado antes de cada missão. Todos os aspectos do processo de tratamento e evacuação de feridos devem funcionar de forma fluida para eliminar as mortes evitáveis em combate e diminuir a CFR. Isso requer um plano médico tático individualizado, bem ensaiado e bem compreendido. Além de compreender a missão e a intenção do comandante, o planejador médico tático deve compreender as forças e os recursos dispostos no campo de batalha.19 O planejamento médico e o planejamento de contingência em apoio às missões dos rangers são processos de baixo para cima. Os paramédicos de pelotão e companhia compreendem a missão tática e o plano médico, bem como os impactos sobre a mortalidade do tempo e de qualquer atraso no recebimento de produtos sanguíneos e cirurgias quando necessário.20 Esse processo de planejamento de baixo para cima, com o devido envolvimento e compreensão do líder, garante que os recursos estejam disponíveis, que atrasos desnecessários na evacuação sejam evitados e que o plano médico seja prático e compreendido por todos os envolvidos, desde a pessoa de escalão mais baixo conduzindo a missão até o comandante de grau hierárquico mais alto da equipe de comando de missão. A distribuição e sincronização do atendimento em tempo hábil e adequado aos feridos em combate dependem de um planejamento médico tático intencional e cuidadoso. Em última análise, esse planejamento médico tático pode representar taxas maiores de sobrevivência de feridos com lesões graves e críticas.
Um plano médico tático é criado pelo planejamento médico individualizado da missão, considerando as nuances e variáveis de cada missão e não aplica um único cenário operacional médico à missão. O plano médico é adaptado à missão. O plano médico inclui o planejamento de contingência para a evacuação e o tratamento de quaisquer baixas ocorridas durante cada fase da missão (por exemplo, infiltração, ações no objetivo e exfiltração). Os comandantes dos rangers planejam a localização de todos os meios médicos em cada fase da operação, inclusive a localização de produtos sanguíneos, e incorporam plataformas de transporte aéreo, terrestre e aquático ao plano de evacuação, tanto para a evacuação padrão de feridos quanto fora do padrão. Dentro dos limites da missão tática, o tempo decorrido até a chegada do sangue e até a cirurgia é priorizado e reduzido, em vez de aplicar a missão tática ao cenário operativo comum médico em nível estratégico. Por meio de planejamento médico tático, ensaios e treinamento adequados, o sistema inteiro funciona em sintonia para agilizar o tratamento e a evacuação de feridos. Em última análise, isso ajuda a reduzir a CFR e a eliminar mortes evitáveis no campo de batalha.
Conclusão
Ao longo de 20 anos de operações de combate no Afeganistão e no Iraque, as Forças Armadas dos EUA e o 75o Regimento Ranger alcançaram baixas taxas de letalidade acumuladas. Além disso, o Regimento manteve o registro de zero mortes pré-hospitalares evitáveis. Mais rangers permanecem vivos hoje em dia graças a um sistema de resposta aos feridos controlado e dirigido pelo comando, que treinou todos os rangers e incentivou práticas e procedimentos médicos inovadores. As lições aprendidas pelo Regimento e os requisitos subsequentes são aplicáveis em todo o Departamento de Defesa. Aplicam-se também a conflitos futuros, e não apenas aos recentes.
Os princípios de domínio e treinamento em APH Tático para Todos, a ressuscitação com produtos sanguíneos nas posições mais avançadas, o controle pelo Comando do sistema de resposta aos feridos e o planejamento médico tático são aplicáveis a todos os ambientes de combate, incluindo operações de combate em larga escala. Embora as operações de combate em larga escala possam exigir cuidados aos feridos no ambiente pré-hospitalar por um período prolongado, em comparação com os períodos mais curtos vivenciados durante as operações de combate no Afeganistão e no Iraque, a base do atendimento prolongado aos feridos baseia-se nos princípios do APH Tático e dele depende.21 Além disso, os comandantes de todas as unidades podem aplicar esses elementos básicos às suas respectivas tropas para reduzir de forma semelhante a mortalidade em combate.
As Forças Armadas estadunidenses devem continuar aprimorando e enfatizando as tarefas essenciais da missão. Minimizar as mortes evitáveis em combate é uma dessas tarefas. Nenhum pai, mãe, irmão, irmã, parente ou amigo deveria perder seu ente querido em razão de uma morte evitável em combate. Além disso, nenhum comandante ou companheiro deve ter que suportar a perda de um de seus companheiros de armas por uma morte evitável em combate.
Referências
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O Cel Ryan M. Knight, do Exército dos EUA, é médico de emergência e ex-Diretor de Saúde do 75o Regimento Ranger. É formado em Medicina pela Uniformed Services University e atua como professor adjunto na Uniformed Services University e na Mercer University School of Medicine. Antes de cursar Medicina, serviu como oficial de infantaria da 82a Divisão Aeroterrestre. Entre suas missões anteriores estão o comando de batalhão e médico de reforço e líder de pequenas equipes cirúrgicas da Joint Medical Unit, Joint Special Operations Command.
O Cel S. Russ Kotwal, da reserva remunerada do Exército dos EUA, conduz projetos estratégicos para o Joint Trauma System, Defense Health Agency, na Base Conjunta San Antonio–Fort Sam Houston, Texas. Tem bacharelado pela Texas A&M University, mestrado em Saúde Pública pela University of Texas Medical Branch e formou-se em Medicina pela Uniformed Services University. Serviu na 25a Divisão de Infantaria, no 75o Regimento Ranger e no Comando de Operações Especiais dos EUA. Foi desdobrado diversas vezes com os rangers para combates no Afeganistão e no Iraque.
O Ten Cel Charles H. Moore, do Exército dos EUA, é o Diretor de Saúde do 75o Regimento Ranger em Fort Moore, Geórgia. É formado em Medicina pela Mercer University e também atua como professor assistente na Uniformed Services University e na Mercer University School of Medicine. Depois de concluir sua residência em medicina de emergência, serviu na 3a Brigada de Aviação de Combate, na 3a Divisão de Infantaria e no 2o Batalhão, Batalhão de Tropas Especiais do Regimento e Destacamento do Comando Regimental do 75o Regimento Ranger, além de participar de diversas missões de combate. *É o principal autor deste artigo.
Staff Ride do Combat Studies Institute
A equipe de Staff Ride do Combat Studies Institute desenvolve e realiza visitas de estudo (staff rides) presenciais e virtuais como uma ferramenta educacional para o Exército dos EUA. Concentrando-se nos aspectos atemporais e universais do combate, as visitas de estudo oferecem insights importantes sobre as operações militares, conceitos de liderança e a realidade do combate por meio de cenários e tópicos para discussão. A equipe de Staff Ride também disponibiliza informações e orientação para as organizações do Exército dos EUA sobre como realizar visitas de estudo com o objetivo de educar os comandantes.
Para obter mais informações, inclusive sobre como solicitar visitas de estudo, acesse https://www.armyupress.army.mil/Staff-Rides/Virtual-Staff-Ride/.
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